professora do Departamento de Teologia da PUC-Rio *

Natal não é ponto de partida, mas de chegada. O povo que esperava o Salvador teve seu desejo atendido! Recebeu o que esperava. Neste fim de ano, nesta nossa amada cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, o desejo que enche o peito e a garganta do povo é um só: paz. Paz para viver, para trabalhar, para construir, para amar, para formar família, para estudar, para fazer arte grande e pequena, para escrever livros e compor musica, para cantar, para viver enfim com tudo que a vida tem de duro e de delicioso, de difícil e de belo.

Avesso ao caos, à desordem, à balburdia, o ser humano anseia pela paz. Seu mais profundo desejo é que finalmente essa paz venha e se instale em seu coração, em sua cidade, em suas relações, em seu país. Desejo adiado, adiado, e às vezes tão pisoteado. Parece que a má notícia da paz e da desordem teima em ocupar espaço, fazer barulho, e bloquear a boa nova de que a paz é possível. E que se encontra entre nós alguém capaz de fazê-la acontecer.

E, no entanto, em meio a essa situação de desavença, ousamos celebrar o Natal. E assim proclamamos que nossa espera foi plenificada. Recebemos o que tanto desejávamos e esperávamos. “ Nasceu-nos um menino – disse o profeta Isaías ao rei que tinha ao lado a esposa grávida -… e ele se chamará… Príncipe da Paz “O povo viveu tempos penosos depois daquela profecia. E chegou a se perguntar: terá o Senhor Deus esquecido de sua promessa? O profeta estaria enganado?

Havia uma jovem em Nazaré prometida a um carpinteiro de nome José. Seu nome era Maria. E antes que coabitassem, ela concebeu um filho. José sofreu diante do mistério que não entendia, mas recebeu o menino e sua mãe. Aquele que Maria recebera em seu seio seria o verdadeiro Príncipe da Paz. E quem viu, ouviu, tocou e apalpou a Palavra da Vida feita carne maravilhou-se e acreditou: este é o verdadeiro Príncipe da Paz, que tanto desejamos e esperamos. Só Ele pode trazer-nos a paz verdadeira que nada nem ninguém pode destruir.

O menino cresceu em graça e sabedoria. Levantou a voz e falou nas praças públicas anunciando a chegada do Reino de Deus, feito de justiça e de paz. Todos os que esperavam e desejavam a paz nunca acontecida o seguiam maravilhados por toda parte. De sua boca saíam palavras de vida e onde pousava seu olhar e suas mãos, o mal era vencido e a paz acontecia.

Aqueles que não queriam a paz o mataram. Mas os que o amavam e o viram morrer logo receberam a boa notícia de que ele estava vivo. Creram e espalharam a novidade, inundados da paz e da alegria que ele prometera. Anunciaram aos quatro ventos que aquele que nascera pequenino do seio de Maria de Nazaré era, na verdade, o Filho de Deus, o Príncipe da Paz.

Só então entenderam aquilo que ele havia ensinado. Lembraram-se de uma vez que falou do alto de um monte e disse “Felizes os que constróem a paz porque serão chamados filhos de Deus”. E entenderam em que consistia essa paz: não em ausência de conflitos, em falsa tranquilidade de consciência, em alienação. Mas em dinamicidade que luta e tudo faz para que a justiça aconteça, dando seu fruto maior, que é a verdadeira paz.

Entenderam que Jesus tinha passado a vida lutando por isso. Morrera por causa dessa luta. E Deus, confirmando sua vida, havia dito: Esse é o meu filho amado. Ouçam-no. Façam como ele.

No Natal celebramos o nascimento do Príncipe da Paz. Ele é o único que pode nos dar aquilo que mais desejamos e esperamos. Mas nós somos responsáveis pela construção e consolidação dessa paz por ele dada, tão cara e fundamental para a vida.

Emmanuel Levinas, grande filósofo judeu do século XX dizia: “… cada um deve agir como se fosse o Messias. O Messianismo não é a certeza da vinda de um homem que detém a História. É meu poder de responzabilizar-me por todos”.

Neste Natal, calemo-nos em adoração diante do menino envolto em faixas e deitado numa manjedoura. Em sua fragilidade repousa a salvação do mundo. Ele é o príncipe da paz. E ao mesmo tempo, responsabilizemo-nos com Ele a construir essa paz tão desejada por nós e por todos que vêm a este mundo. Ofereçamo-la, sobretudo ao que está próximo a nós. Seremos felizes, bem-aventurados. E chamados filhos de Deus!

* Autora de “Simone Weil – A força e a fraqueza do amor” (Ed. Rocco). http://wwwusers.rdc.puc-rio.br/agape/

Copyright 2010 – MARIA CLARA LUCCHETTI BINGEMER – É proibida a reprodução deste artigo em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização. Contato – MHPAL – Agência Literária ([email protected])

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