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A ONU dedica o dia 1º de outubro em honra das pessoas idosas e à conquista dos seus direitos. Cada dia mais esta comemoração é oportuna porque, nestas primeiras décadas do século XXI, a humanidade conta com mais gente acima de 65 anos. A medicina já fala em terceira, quarta e até quinta idade. Em todos os continentes, aumenta o número de pessoas centenárias, embora em alguns países pobres da África a profunda injustiça social e a exploração dos países ricos continuem garantindo para aqueles povos uma média de vida ainda muito baixa. No Brasil, o censo deste ano mostrará um progressivo envelhecimento da população. “A população brasileira com mais de 65 anos já aumentou em 2, 5 milhões de pessoas. (…) O Brasil tem hoje 10% da população ativa com mais de 60 anos e chegará a 30% em 2050” (Isto É, 29/09/2010).

Este fato desencadeia novos desafios sociais: maiores cuidados com a saúde pública, a garantia de trabalho, de vida ativa e máxima autonomia possível, participação nos destinos do país e possibilidades de lazer, assim como a segurança nas atividades cotidianas, como a garantia de ir e vir, subir em ônibus adaptados à sua idade e assim por diante. Não basta garantir que as pessoas vivam por mais tempo. É essencial que possam gozar de uma qualidade de vida humana digna. Em países da Europa, a economia que visa apenas o lucro das empresas retarda sempre mais a idade da aposentadoria. Muitos homens e mulheres, aos 70 anos, devem trabalhar para garantir o sustento, enquanto jovens de 30 não conseguem um emprego que lhes permita deixar a casa dos pais e casar.

De todas as responsabilidades sociais para com as pessoas idosas, sem dúvida, a maior é uma verdadeira integração dos mais velhos na família e na comunidade. Quem conhece povos indígenas e visita comunidades negras, remanescentes de Quilombos ou grupos de religião afro-descendente perceberá que ali pessoas mais velhas têm função de destaque na comunidade. Cumprem o papel de bibliotecas vivas que garantem a memória do grupo. Na sociedade moderna, cada vez se dá mais importância à beleza e à elegância do corpo. Todo mundo quer mostrar um corpo sarado. Muita gente recorre até a operações plásticas para parecer mais jovem. Isso não teria conseqüências negativas, se não fizesse parte de uma cultura na qual a pessoa mais velha se sente inútil, ou porque não é mais plenamente produtiva, ou porque, a cada dia, sente mais a necessidade do apoio dos filhos e netos para atividades que antes desempenhava sozinho/a.

Nos aeroportos brasileiros, na hora do embarque, aeromoças de uma companhia aérea chamam os idosos como “pessoas de melhor idade”. Não é fácil ver o corpo enrugar, as forças desaparecerem progressivamente e a gente sentir dores e incômodos espalhados da cabeça aos pés. Algumas pessoas têm a sabedoria de, ao mesmo tempo em que o corpo definha, cuidar do espírito e este se aprimora. A mente se torna mais capaz de interpretar a vida e o mistério permanente das relações. Às vezes, a idade torna o coração mais duro e vacinado para amar. Mas, se nos preparamos melhor para enfrentar estas mudanças naturais da vida, a sabedoria da idade nos tornará capazes do amor gratuito e desinteressado que nos torna mais felizes. Além de mim mesmo, já escutei outras pessoas confessarem que se pudesse escolher manter-se na idade de hoje ou voltar a vinte ou trinta anos no tempo, prefeririam permanecer na idade atual. É claro que isso depende de toda a vida. Não é uma atitude interior que se possa improvisar. Quem se deixou levar por uma ideologia individualista e não cultivou nenhum projeto elevado de vida terá mais dificuldade de encontrar sentido no passar dos anos. Ao contrário, uma irmã de 91 anos que sempre doou sua vida aos mais pobres vive ainda ativa e feliz. Ela me dizia: “O segredo é optar por envelhecer sem se tornar dentro de si mesma uma pessoa velha e amarga”. Perguntei como fazer isso e ela me respondeu: “Não se levar demasiadamente a sério e não se tornar pesada nem para si mesma nem para as pessoas que a cercam”. Isso me lembra o grande arcebispo Dom Hélder Câmara que dizia: “À medida que envelhecemos, devemos cuidar de ser como um bom vinho que quanto mais velho é mais saboroso e não nos tornarmos amargos como vinagre”. Eduardo de Filipo, ator e diretor italiano, dizia: “Um homem que sabe verdadeiramente amadurecer nasce velho e morre criança”. Quem conheceu de perto homens como Dom Hélder ou o grande intelectual Dr. Alceu Amoroso Lima viu isso se concretizar em suas vidas. É um caminho aberto e possível a todos nós.

(*) Monge beneditino, teólogo e escritor.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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