D. Edvaldo G. Amaral 5 de julho de 2010

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Este nome – Hibakusha – que nos parece tão estranho, designa as vítimas do holocausto nuclear, nas duas cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki. A visita que mais me impressionou nos quatro meses que passei no Japão – de maio a setembro deste ano – foi, sem dúvida alg uma, a que fiz à Praça da Paz e ao Museu da Bomba Atômica em Nagasaki .

Não sou, nem nunca fui anti-americano. Pelo contrário, até sempre tive certa consideração, nos meses que lá passei, pela grande nação americana, com seu progresso, sua organização social e econômica, que a transformou, após a Segunda Guerra Mundial, na mais poderosa nação do planeta, com todos os seus erros militares e políticos. Mas, voltei do Japão com uma convicção: o que os terroristas islamitas fizeram no dia 11 de setembro de 2001 foi uma brincadeira – seja de mau gosto – mas uma brincadeira, comparada com que os americanos fizeram em Nagasaki, sem falar de Hiroshima, que não vi. A morte em segundos de mais de 40 mil pessoas, incluindo velhos, nenéns, homens e mulheres, todos civis, com a seqüência de centenas de milhares de pessoas, que ficaram doentes nos dias subseqüentes, não tem comparação com a destruição das Torres Gêmeas, com alguns milhares de vítimas adultas. É que a História é sempre contada pelos vencedores e esquece depressa os vencidos.

Naquele fatídico 9 de agosto de 1945, às 11;02 da manhã, numa população de 240.000 habitantes, morreram 73.884 e ficaram feridos 74.909. Calcula-se que pereceram nas duas cidades atingidas pela bomba atômica um total de 190.000 a 230.000 pessoas. No epicentro, onde caiu a bomba, a temperatura chegou a 4.000° centígrados. A rádio-atividade atingiu as pessoas, arrancando a pele, queimando a carne viva, fazendo saltar seus globos oculares e seu intestino, provocando a dilaceração do tecido ósseo e das vísceras. As pessoas atingidas perto do epicentro transformaram-se simplesmente em cinzas, levadas pelo vento, como aconteceu com Midori, a esposa do Dr. Tagashi Nagai, da qual no dia seguinte ele só encontrou as contas do rosário. Outras enfermidades apareceram posteriormente, cujos sintomas eram fadiga, náusea, vômito, febre alta, diarréia, hemorragias, perdas dos cabelos, diminuição dos leucócitos. Ainda outras doenças como leucemia, câncer, quelóides (cicatrizes por excesso de tecido), catarata e o chamado “bura-bura” que era uma fadiga tal que impedia a locomoção. Esses formaram a imensa legião dos “hibakushas”, toda uma geração dos habitantes de Nagasaki e arredores. Crianças nasceram com graves anomalias, como falta de cérebro e outras mais, levando as moças a não querer mais casar-se, ou, casando, não ter filhos. Nos anos ´80, havia ainda no mundo cerca de 400.000 hibakushas, tristes vítimas do holocausto atômico.

Não havia motivo alguma que justificasse aquelas duas bombas nucleares. Em agosto de 1945, o Japão já estava totalmente derrotado e enfraquecido. Havia perdido sua marinha de guerra e a aviação militar. Não tinha absolutamente condições de continuar mais a guerra. Só esperava uma rendição, que não fosse incondicional, como a da Alemanha. Não é verdade o que afirmou o Presidente Truman: que decidira utilizar a bomba atômica para acabar rapidamente com a guerra e evitar mais vítimas, tantas foram as vítimas do bombardeio nuclear. Aliás, essa de mentir tem sido uma das fraquezas mais comuns dos últimos presidentes americanos. Desde o católico Kennedy, com suas ocultas amizades cinematográficas, passando pelo renunciante Richard Nixon, com seu Watergate e as fitas de gravação, a Bill Clinton, com suas aventuras nos corredores do Salão Oval e sua estagiária, até o criador de guerras como o sr. George W. Bush, com suas desculpas de armas de destruição em massa no Iraque, nunca encontradas. A verdade é que os EE.UU., àquela altura, queriam amedrontar a União Soviética na estratégia do pós-guerra, quando já começavam os primeiros sintomas da guerra fria e os russos ainda não possuíam a bomba atômica.

Havia no mundo, em 1982, mais de 40.000 armas nucleares, o que equivale a l milhão de bombas iguais à que destruiu Hiroshima. Após tanto sofrimento, Nagasaki tornou-se hoje o centro do Movimento mundial de repúdio e condenação da guerra nuclear. “As armas nucleares estão apontadas para mim, para você e para todos aqueles que nós amamos. Faça o que você puder para que desapareçam da face da terra, as terríveis armas nucleares” – é a mensagem do Movimento Hibakusha.

(*) É arcebispo emérito de Maceió.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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