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Santo Antônio continua sendo homenageado pela piedade popular. Sua mensagem é sempre atual. As trezenas, ou tríduos, se espalham por todos os lados. É pena que a grande Trezena que se realizava até bem pouco na Praça da Sé, deixou de existir. Lembro-me ainda, de uma das últimas, com a presença de D. Canô Veloso, que no seu zelo santamarense, trouxe até um ônibus com integrantes do coral para cantar naquela celebração.

A Casa do Samba de Roda de D. Dalva em Cachoeira, fará um Tríduo, que se realizará nos dias 11,12 e 13/06 – lá estarei na primeira noite. Essa devoção está no coração dela, pois já é decorrência do pai. Ela irá cantar hinos do tempo dele e que os conserva na memória da família com toda veneração.

O santo, para o ideário católico, é um herói da fé. Ele encarna virtudes, é um exemplo, portanto, é uma figura modelar. Normalmente, a mensagem deles não fica circunscrita ao seu tempo, mas atinge gerações de outras épocas. Claro que nesse périplo sacro, o imaginário popular, misturado com devoção, crenças e mais outros elementos, povoa, muitas vezes, a vida deles de elementos que não são históricos – surgem novas reinterpretações. Com o nosso Santo festejado também aconteceu esse fenômeno. É tão tradicional vê-lo com o Menino Jesus nos braços, mas esse elemento só foi acrescentado um século após sua morte.

S. Antônio congrega dois direcionamentos, isto é, de um lado há a leitura popular, e de outro, ele representa um grande teólogo, com uma interpretação conceitual da Teologia do seu tempo, reconhecida até por S. Francisco, de quem fora contemporâneo. Dos Escritos do fundador podemos extrair esse pequeno, mas sintomático bilhete: ”Eu, Frei Francisco, saúdo a Frei Antônio, meu Bispo. Gostaria muito que ensinasse Teologia aos irmãos, contanto que nesse estudo não extingam a santa oração e a devoção, segundo está escrito na Regra. Passar bem”.

Que atualidade de Francisco. Ele foi tão grande e denso que a própria estrutura franciscana, criada por ele, não o suportou. Em tudo, nele, prevalecia a simplicidade à qual a própria Teologia teria que se submeter ( contanto que… ).

Nascendo em Lisboa, morreu o Santo em Pádua em 1231 (a igreja na qual está sepultado é conhecida como “a igreja do Santo”),e assim ele se tornou objeto de múltiplas devoções que julgavam eficaz sua intercessão para resolver problemas , dos mais variados.

A devoção aqui no Brasil, como tantas outras, foi trazida pelo português. E lá, na terra natal, seu culto começou a ser popularizado, no século XV, quando a casa em que ele nasceu em Lisboa, se tornou uma capela e, depois, um convento franciscano. Está localizada em frente à velha Sé, na ladeira que sobe para o Castelo S. Jorge.

E o Santo, nesses séculos todos, tem operado em lógicas distintas: pobres e ricos, doentes e sadios, e as que querem se casar, todos a ele recorrem. Dentro dessa multiplicidade de lógicas, encontramos o Pe. Vieira, em meados do século XVII dizer num Sermão pregado no Maranhão: ”Se vos adoece um filho, S. Antônio; se vos foge o escravo, S. Antonio; se esperais o retorno, S. Antônio ( … ); se vos some a menor miudeza de vossa casa, S. Antônio”.

Por aí, se vê, que ele servia para tudo. Mas não deixa de ser intrigante hoje e “natural”, para a época, ele servir até de capitão do mato, isto é, de caçador de escravo fujão. É um percurso devocional, pelo menos estranho, para um homem que bebeu na fonte de S. Francisco, para quem tudo era “irmão”: “Irmão sol, irmã lua, irmão lobo, irmã morte, irmã água”. Santo Antônio bebeu na fonte do “poverello” de Assis, que levou a vida simples e pobre a um extremo tal que chocou até os seus irmãos de hábito. Se há culpa nessa apropriação de Vieira, não é do Santo, mas reflete uma época e uma linguagem da qual estamos distantes (mas que infelizmente deixou resquícios que, ainda, subsistem fortemente). Há um livro atual sobre o Santo, de Antônio Jorge Moreira Garrido – “Santo Antônio, uma vida só de amor” – que se pauta por esse caminho. A intenção do autor é “divulgar tudo, sobre a passagem de Frei Antônio pela Terra, seus benefícios, milagres e sua completa doação aos pobres”. E ainda acrescento que a renda desse livro foi revertida para as Obras Sociais de Irmã Dulce, a Nova Beata (Bem- Aventurada) da Bahia.

Com D. Dalva de Cachoeira, concluímos saudando o Santo com o Responso:” Se milagres desejais, recorrei a S. Antônio (… ); o fraco torna-se forte e torna-se o enfermo são; todos os males humanos se moderam, se retiram, e digam-no os que o viram e digam-no os paduanos”.

Sebastião Heber. Prof. Adjunto de Antropologia da UNEB, da Faculdade 2 de Julho. Membro do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e da Academia Mater Salvatoris.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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