teóloga, professora e decana do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio.
O mês de maio nos traz inevitavelmente a proximidade da mãe de Jesus, Maria de Nazaré. Mês das noivas, mês das mães é antes de tudo e principalmente mês de Maria. Sobretudo em país como o nosso, onde a devoção mariana é elemento constitutivo e fundamental da vida do povo católico, não se pode deixar de nela pensar, a ela recorrer a ela invocar neste vale de lágrimas em que anda a vida humana nos últimos tempos.
Mas permanece sempre uma pergunta fundamental no coração dos católicos. Quem é Maria afinal? Qual o seu lugar na história da salvação? Que posto ocupa em relação a seu filho Jesus no mistério cristão?
Maria não é deusa, nem divina. Contrariamente à acusação que às vezes pesa sobre o catolicismo, nunca se disse nem sequer se pensou que Maria pudesse ser equiparada a seu filho com relação à dupla natureza, humana e divina. Maria é apenas humana, plenamente humana. Como nós. Igual a nós. Em tudo. Criatura, saída das mãos do Pai com gozo e agrado. Como nós. De carne e osso.
Maria é, portanto e antes de mais nada, criatura. Alguém que participa intimamente de nossa condição humana e nossa finitude.
Viveu em um tempo histórico e foi a mãe judia do homem Jesus de Nazaré.
Para a teologia e a espiritualidade católica, é central a afirmação de que esta que foi uma viva na história, é hoje alguém que vive em Deus. Nos que «vivem em Deus» se projeta a situação de todos os que “vivem na história”, situação de limitação e ao mesmo tempo de desejo do ilimitado. A jovem mulher de Nazaré hoje é instância à qual recorrem aqueles que, na história, estão sofrendo e penando por qualquer classe de obstáculos e dificuldades. A ela acorrem como mulher que vive em Deus e que portanto, tem poder de ajudá-los.
O conceito de reino de Deus é essencial para a hermenêutica que orienta a teologia Mariana atual. A explicação deste conceito vai além da pessoa de Jesus. Afeta a totalidade de seu movimento, do qual participavam homens e mulheres em forma ativa. A partir dele, poderão ser lidos os feitos de Maria, nas diferentes imagens que o reino de Deus assume na Escritura, na tradição e nas tradições, como feitos que fazem presente os sinais do reino de Deus, ações concretas que manifestam a presença de salvação na história humana. A figura de Maria fala de Deus e de seu reino, da proximidade da divindade vivida pela mulher; fala do Filho de Deus que nasce do povo e da mulher; fala dos muitos filhos engendrados pelo Espírito de Deus, que não nascerão da carne nem do desejo do varão, mas sim de Deus.
Uma teologia Mariana da perspectiva do Reino de Deus permite perceber, também, a paixão de Maria pela justiça de Deus e, através dela, permite recuperar a força do Espírito atuante nas mulheres de todas as épocas. É a recuperação da «memória perigosa» ou “memória subversiva”, capaz de transformar as coisas, pois mantém vivas as esperanças e lutas das mulheres do passado, e permite que nasça e cresça uma solidariedade universal entre as mulheres do passado, do presente e do futuro. Nesta perspectiva, Maria não é somente a encantadora e suave mãe de Jesus, mas sim é, acima de tudo, trabalhadora na colheita do reino, membro ativo do movimento dos pobres, tal qual Jesus de Nazaré.
Por isso diante da pergunta: qual o lugar de Maria? Quem é Maria para nós? Respondemos sem hesitar: nossa irmã, viva na comunhão dos santos, que nos precede marcada com o sinal da fé. Ave Maria, rogai por nós.
Maria Clara Bingemer é autora de “Deus amor: graça que habita em nós” (Editora Paulinas), entre outros livros.
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