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Cachoeira, como sempre, está impregnada de festas. O S. João está às nossas portas e vem a data magna do 25 de junho. Mas como será tudo isso, pela primeira vez, sem Damário Dacruz ? O Divino Poeta chamou-o para ouvir seus poemas bem de pertinho …

No seu livro de poesias RE(SUMO), ele mesmo se apresenta:”Soterocacheirano ( nascido em Salvador e Cidadão de Cachoeira, no Recôncavo Baiano), filho da República Popular da Bahia, líder estudantil, líder sindical, diretor da Fundação cultural do Estado da Bahia, editor de jornais de arte e cultura, diretor, coordenador e gerente de comunicação publicitária e de patrocínios culturais de estatais e multinacionais. Fotógrafo com várias exposições no Brasil e no exterior. Sua poesia espalhou-se em dezenas de jornais , revistas, blogs, sites e paredes da América latina. Quarenta anos de estrada na poesia. Prêmios, conferências e viagens a muitos lugares distantes, e por diversas vezes. Três livros e mais de 30 posters-poemas publicados. Criador e coordenador do Pouso da Palavra em Cachoeira, pertence a geração de poetas da Bahia dos anos 70/80 , jornalista, publicitário, muitos amigos e pai de Damine e Dimitri. E chega ! , por enquanto”.

É assim que ele se apresenta. Mas ele é um poeta de travessias, como diz Edmar Ferreira, poeta e mestre em História: ”Ele é um feiticeiro de versos em movimento. A poesia de Damário Dacruz se move em águas reais e imaginadas, atravessa certezas, embaraça dúvidas e escolhas , bebe luas, tropeça em ausências, deseja amores e sustos. Tudo demasiado humano, ele e seus olhos, nós e os nossos olhos, chamados a ver e nos rever, convidados a nos ultrapassar como quem sonha transpor o sol, conduzindo-nos a outra margem, para exercitar a vida e a diferença. Esse humano poeta de travessias”.

Nesse artigo/homenagem ao amigo poeta, sou grato pela boa acolhida que sempre tive na sua Casa/Galeria/Poema, e, especialmente, por ter estado presente na Missa dos meus 30 anos de sacerdócio lá na Conceição do Monte. Também não faltou à abertura da Casa do Samba de Roda de D. Dalva. Por tudo que ele sempre representou, penso que seja melhor deixar que ele mesmo exale o odor de sua poesia, ou que outros poetas transpirem a suavidade do perfume da palavra dele. No seu poema “Armadilha”, num realismo profundamente existencial, ele, como que profetizando o seu fim, diz:”A vida teima em ser mais curta e menos útil/. A vida inventa mil atalhos, provocando fugas/. A vida não se engana ( não se engane), a vida só vale a vida”.

O poeta e cordelista, Antônio Barreto, in memoriam, ofereceu a Damário, um belo poema que passo a reproduzir na íntegra:

“ Damário da Cruz, poeta/Acaba de viajar/Com destino a uma Estrela/Que não deixa de brilhar.

Ali será o seu ninho/De musas, versos e vinho/No calor do verbo amar.

A saudade desde já/Cobre os mares da Bahia…/E o rio Paraguaçu/Nesse instante silencia,

Reverenciando o vate/Que criou o xeque-mate/Da singela poesia.

Escreveu com maestria/ O ofício da paixão/E deixou a luz acesa/Na varanda e no porão

Ensinando a todos nós/Que o ódio é uma foz /Longe do seu coração.

Pai, poeta, amigo, irmão,/Um querubim antenado…/Que, sem apelo e rancor,

Registrou o seu legado./Sem a lança da maldade,/Partiu deixando saudade/Como um verdadeiro bardo.

Por todo caminho andado,/Damário foi benfeitor./Seu coração de menino/Não conheceu desamor.

Anjo de luz altaneiro,Da lisura, um carpinteiro:/Um alquimista do amor.

Seu revólver: uma flor;/A língua: ponderação;/Sua ofensa: o silêncio;

Seus versos: contemplação./Companhia imperdível,/Um amigo inesquecível:/Um anjo na imensidão…”.

E é o próprio Damário Dacruz quem conclui esse artigo/homenagem, com o seu último poema/profecia, intitulado “Gran finale”:

“Avise aos amigos/ que preparo o último verso/ A vida/ dura menos que um poema/ E no alvorecer mais próximo/ saio de cena“.

Matisse disse, no final de sua vida, “que o artista não morre. Vive sempre, através de sua obra”.

Damário Dacruz, “requiescat in pace” – descanse em paz.

Sebastião Heber.Professor Adjunto de Antropologia da UNEB, da Faculdade 2 de Julho, Membro do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e da Academia Mater Salvatoris.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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