Quando a religião Católica popular surgiu, há mais que um milênio, a liturgia no mundo todo era realizada na língua latina, que quase ninguém entendia mais. Artistas criaram em vidro cenas da vida de Jesus e dos santos nas janelas das catedrais. Em geral, a educação religiosa se realizou pelos pais explicando para os filhos o que entendiam através dessas cenas. Andando de uma janela a outra, os pais contaram as histórias configuradas para que os filhos pudessem entendê-las.

As histórias que passaram dos pais aos filhos tocaram todos os ramos da fé e da devoção. As vidas dos santos assumiram uma importância sempre crescente. Vê-se isso, por exemplo, ao denominar São Judas como padroeiro dos casos sem esperança ou Santo Antonio com o chefe de coisas perdidas ou para arranjar um noivo. Não que isso seja mau, mas mostra um conhecimento de fé ainda infantil. O povo pendurava fitas coloridas nas estátuas e deixava velas acesas para afirmar a sua confiança em que o pedido seria ouvido. Devoção aos santos tendia a afastar os devotos de sua responsabilidade pessoal, das dificuldades e esperar que o santo tomasse conta dos problemas.

Talvez mais extremas foram as devoções a Maria, mãe de Jesus. Uma mulher pobre e uma doméstica que cuidava do lar – preparava a comida, limpava a casa, e que lavava a roupa sua e do marido e filho – está na nossa mira por seu amor e fidelidade com que trabalhava. Ela mesma descreveu a sua missão dizendo: “Minha alma engrandece o Senhor” (Lc 1:46). Ela mal entendia ainda o que significava que o filho seria o filho do Altíssimo (Lc 1:32). Ela vivia perto de Deus e disse que ela seria como uma lupa para engrandecer o Senhor. Ninguém olha uma lupa; se mira pela lupa a não ser para observar algo magnificado. Parece no Novo Testamento que a missão óbvia da Maria foi de chamar atenção ao filho para que ele fosse visto, seguido, e obedecido.

Infelizmente, a religião popular enfatiza tanto Maria, que reduz a nossa atenção ao Filho. A atenção dada a Maria está cheia de valores humanos e materiais. Será que alguma vez Maria apareceu a alguém com uma tiara na sua cabeça? Qual a razão de lhe dar uma nas estátuas e pinturas? Esta mãe santa e heroína, pobre e doméstica, aparece vestida com a roupa de uma rainha rica. Não há mal nisso, suponho, mas será que Maria anda satisfeita que esta atenção dada a sua imagem esteja distraindo-nos do seu Filho? Damos mais e mais títulos a ela – Perpétuo Socorro, Estrela da Manhã, Vaso Insigne de Devoção, Torre de Marfim, Casa de Ouro, Arca da Aliança, Porta do Céu, Estrela da Manhã, Saúde dos Enfermos, Refúgio dos Pecadores, Consoladora dos Aflitos, Auxílio dos Cristãos, Rainha dos Anjos, Rainha dos Patriarcas – e esperamos que ela resolva todas as nossas dificuldades com graças e milagres. Ela não é divina, mas o seu filho é – o Filho de Deus. Nas orações oficiais da igreja, pede-se a Maria que reze conosco para o seu Filho – “Rogai por nós.” Em nenhum lugar as orações oficiais são para que ela reze em nosso lugar como se fosse um pistolão poderoso. Infelizmente muitos entre nós agem assim, ainda que isto seja a maneira infantil de agir.

Se a religião popular mantiver uma religiosidade imatura, própria para crianças, pergunta-se como deveriam as comunidades de fé e paróquias promover uma fé madura? É mais fácil achar a resposta que vivê-la. No Novo Testamento, os quatro Evangelhos nos apresentam quatro teologias de Jesus e sua missão. Eles foram escritos depois da destruição do Templo hebraico para comunidades diferentes espalhadas pelos apóstolos no mundo conhecido. Mas as Epístolas são cartas que foram escritas antes para instruir os membros das comunidades na vivência da sua fé. Numa maneira diferente, cada carta descreve a fé madura e como chegar a ela. Está nelas que se acha o caminho, a verdade, e a vida para chegar a uma fé madura – para chegar a ser o sal da terra ou a luz do mundo (Mt 5:13-14). As epístolas são para nós uma janela pelo qual podemos assistir os esforços das primeiras comunidades de fé para construir o Reino de Deus.

A fé madura abrange três pontos: amor, perdão, e serviço (Mt 5:44-48; 25:34-36, 40). Ser cristão de fé madura, a sua vivência está à vista, vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana. A missa dominical não é como um posto de gasolina para nos manter durante a semana vindoura, não. Ela é onde os membros da comunidade ou paróquia possam se reunir para celebrar a semana que passou – as vitórias e os fracassos, os serviços realizados e as fugas das oportunidades de levar Cristo ao necessitado. A missa dominical está onde somos perdoados e onde perdoamos; onde saramos e renovamos as nossas vidas e atitudes. Ela está onde tornamos as histórias pessoais da semana que passou e todos que participaram nessas histórias outra vez no Corpo e Sangue de Jesus. Ela está onde podemos dizer com São Paulo: “Eu vivo, mas já não sou eu que vivo, pois é Cristo que vive em mim. E esta vida que agora vivo, eu a vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim” (Gal 2:20).

A revisão pelo leitor:

Explicar como os sacramentos podem ser instrumentais em lhe ajudar ou lhe preparar para reagir às citações seguintes:

1) “Eu lhes garanto: se vocês não se converterem, e não se tornarem como crianças, vocês nunca entrarão no Reino do Céu” (Mt 18:3).

2) “Se vocês tiverem amor uns para com os outros, todos reconhecerão que vocês são meus discípulos” (Jo 13:35).

3) “O amor não pratica o mal contra o próximo, pois o amor é o pleno cumprimento da Lei” (Rom 13:10).

4) “Ainda que eu tivesse o dom da profecia, o conhecimento de todos os mistérios e de toda a ciência; ainda que eu tivesse toda a fé, a ponto de transportar montanhas, se não tivesse o amor, eu não seria nada” (1 Cor 12:2).

5) “Vocês todos são filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo, pois todos vocês foram batizados em Cristo, se revestiram de Cristo. Não há mais diferença entre judeu e grego, entre escravo e homem livre, entre homem e mulher, pois todos vocês são um só em Jesus Cristo” (Gal 3:26-28).

6) “Em Cristo, vocês também são integrados nessa construção, para se tornarem morada de Deus, por meio do Espírito” (Ef 2:22).

7) “Idólatras! Vocês não sabem que a amizade com o mundo é inimizade com Deus? Quem quer ser amigo do mundo é inimigo de Deus” (Tiag 4:4).

8) “Vocês também, como pedras vivas, vão entrando na construção do templo espiritual, e formando um sacerdócio santo, destinado a oferecer sacrifícios espirituais que Deus aceita por meio de Jesus Cristo” (1 Ped 2:5).

Copyright – por A Sociedade dos Irmãos da Congregação de Santa Cruz.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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