Estamos no Ano de Joaquim Nabuco, um dos maiores homens de visão na história do país. Um rico que fez opção pelos pobres, um senhor que se bateu, intelectual e politicamente, pela abolição da escravatura. Para ele, porém, sabiamente, não bastava conceder liberdade aos escravos. As bases da liberdade teriam de ser a posse da terra e a educação. A história lhe deu sobejamente razão. Da abolição sem reforma agrária e sem reforma da educação, nasceu o povo das favelas, da marginalização e da exclusão. Não é acaso que a maioria da pobreza seja de gente negra, para vergonha moral da cruel elite brasileira que ainda hoje define sua identidade pelo “ethos” do “senhor de engenho”, dono da terra e das gentes.
As lições bíblicas atingem seu ápice na liturgia de hoje com o trecho de São Mateus, capítulo 6º, o texto clássico da Quaresma, tirado do Sermão do Monte. Jesus fala dos três exercícios que caracterizam este longo retiro de preparação da Páscoa:
Esmola – esmola no sentido profundo de “elemosina”, isto é, misericórdia, sentir a dor dos miseráveis, solidariedade para restaurar a justiça;
Oração – encontrar-se com Deus como segredo intimo de nossa vida, fonte secreta de valores, critérios, atitudes e comportamentos, programar a vida pela Oração do Senhor, “Pai nosso, “ pão nosso”;
Jejum – privar-se, contentar-se com o necessário, não por desprezo pelos bens da vida que são criaturas e dons de Deus, mas por amor a quem necessita, privar-se, economizar para poder partilhar. Esmola e jejum são apelo à partilha, são a maneira de sermos generosos, semelhantes a Deus. Partilha de bens e partilha de perdão são o jeito de parecer com Deus.
Finalmente, as palavras de Jesus se concluem com o texto que acabamos de ouvir: “Não podeis servir a Deus e o dinheiro. Por isso não vos preocupeis…” e vem o texto famoso que exorta a ser como flores do campo e aves do céu, confiantes na bondosa providência divina.
Acusam a Jesus e a nós também de românticos idealistas. Como viver sem pôr confiança no dinheiro, não seria irresponsável? Longe de ser idealista ingênuo, Jesus insinua claramente a importância da Economia. Por que podemos viver sem a angústia do amanhã, por que podemos confiar na vida e no futuro? Não se trata de ser irresponsável, trata-se, antes, de vencer a angústia e, assim, não se deixar prender na cadeia do dinheiro e do afan pelos bens materiais. É que a proposta de Jesus é a comunidade, e a base econômica, realista da vida em comunidade, isto é, de igualdade, de solidariedade e de justiça, é uma economia de partilha e não de apropriação por parte de poucos. Na comunidade temos apoio nas necessidades, podemos confiar uns nos outros. Acabam a incerteza e a angústia.
(*) Bispo da Diocese Anglicana do Recife – DAR
www.dar.ieab.org.br
Obs: A Parte V será postada no próximo dia 18 de maio