Pergunto à vendedora o nome da manga exposta em sua barraca. A resposta me deixa espantado: manga-sergipe. Não a conhecia. Parece um peixe, de desenho animado, o palito do umbigo retraído, um tanto escondido, as duas papadas sobressaindo, quase comprida, como se tivesse sofrido um aperto dos dois lados. Em casa, faca na mão, separada a casca, vou cortando e me deliciando.

Peço licença para me incluir no feirante curioso que, na época da safra, fica de olho nas bancas de frutas, em nível de feira do Grageru (em Aracaju), na busca de novidades em termos de manga. Não sei qual seria o termo devido para qualificar um feirante assim, com a mania (mania, ressalte-se, para não confundir com tara) por manga. Nada encontro a respeito no dicionário.

Nessa caminhada, estou com os antigos, na reverência, em nível de maior exploração, a manga-rosa e a manga-espada. Não sei qual das duas é a melhor, embora apresente ligeira queda pelarosa. São as mais comerciais e saborosas, de maneira a me levar a uma verdade: manga é espada ou é rosa. As demais, sim, se constituem em exceção.

Nesta exceção, incluo três com nome feminino: manga-maria, manga-carlota, manga-cecília. Esclareço que uso nomenclatura eminentemente sergipana. Em outros estados, a terminologia é diferente. Nos arredores de Teresina, por exemplo, conheci uma manga, parecida com a espada. Seu nome: manga-fiapo, termo que o sergipano não conhece.

A manga-maria sofreu alterações com o tempo. Quando menino, em Itabaiana, no enorme quintal da casa de tia Madrinha, conheci a manga-maria, pequena, de cor verde. Fui encontrá-la, anos e anos depois, na Praia do Saco (em Estância), um pouco maior e com a cor rosa, ou seja, totalmente diferente da outra. A manga-carlota e a manga-cecília se assemelham: redondas, não volumosas, num verde amarelado, causando a impressão quase de uma pequena bola. A manga-carlota deve ser a carlotina, que vi citada em livros do ramo.

Outro dia me deparei coma manga-coco: profundamente imensa. Fico imaginando como consegue, com aquele peso, ficar pendurada. No sabor algo de amargo, que, no fundo, lhe dava mais realce. Talvez receba o nome coco por ser grande e um tanto arredonda. De branco nada carrega em seu interior.

Já a manga-caxangá é uma criação nova. Dela nunca tinha ouvido falar. Seu formato é bonito, na exibição do verde, do rosa e do violeta. Não chega aos pés da rosa. A manga-caxangá se parece com a manga-tommi, vendida anualmente nas feiras, enormes, formalmente lindas. Costumo dizer, brincando, que é a fruta que mais se parece com a manga. Em supermercado, em Portugal, na cidade do Porto, na rua Via Catarina, vi dessas mangas, oriundas do Brasil, e parei, saudoso de um cuscuz com carne frita de galinha, no mercado de Aracaju, para contemplá-las: magras, quase toicinhos ressecados, cumpridas, a casca de um verde sem brilho. Nem porco, com três dias de fome, se arriscaria a mastigar as mangas ali expostas.

Uma vez, em um hotel, em Brasília, vi alguémdescascar uma manga, sem melar as mãos, façanha que nunca consegui realizar. Da manga, por ora, é a única frustração que carrego, apesar de mais de vinte anos de treinos fracassados.

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Publicado no Diário de Pernambuco

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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