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Visitar o Juazeiro do Norte é encontrar o Pe. Cícero, com seu carisma presente, atraindo milhares de romeiros que lá chegam para pagar e renovar promessas.

É incrível como tudo lá gira em torno da presença dele. E imaginar que na ocasião de sua morte, seus inimigos gratuitos apregoaram que morto o ídolo, a cidade que ele fundou e a devoção à sua pessoa, acabariam logo. Grande engano. A cidade continua prosperando e a devoção se multiplica.Anualmente, no Dia de Finados, uma grande multidão de romeiros, vinda dos quatro cantos do país,chega ao seu túmulo na Capela do Socorro, no Cemitério por ele fundado.

Pe. Cícero nasceu no Crato no dia 24 de março de 1844. Era filho de Joaquim Romão Batista e de Joaquina Vicência Romana,conhecida como Dona Quinô. Em 1865 entrou no famoso Seminário da Prainha em Fortaleza ( D. Helder Câmara também lá estudara) e foi ordenado no dia 30 de novembro de 1870. No Natal de 1871, convidado pelo Prof. Semeão Correia de Macedo, ele visitou pela primeira vez o povoado de Juazeiro e aí celebrou a tradicional Missa do Galo. O novo padre causou uma grande impressão na população e a recíproca foi verdadeira. Tanto que , decorridos alguns meses, eis que ele lá chegava com a mãe e duas irmãs, para fixar residência definitiva no Juazeiro. Muitos livros relatam que ele teve uma visão de Cristo, numa cena da Última Ceia. De repente adentra uma multidão de pobres, carregando seus parcos haveres, como retirantes nordestinos. E Cristo voltando-se para eles mostra a decepção com a humanidade que não se preocupava com a pobreza. Mas diz que fará ainda um último milagre. E apontando para os pobres, dirige-se ao Pe. Cícero dizendo: “E você, Pe. Cícero, tome conta deles”.

Seu apostolado foi, em torno do pequeno povoado de taipa, com uma pequena capela erigida pelo primeiro capelão , Pe. Pedro Ribeiro de Carvalho, que ele logo tratou de melhorar o aspecto, com as esmolas dadas pelos romeiros.Seu apostolado se desenvolveu a partir de dois pólos: visita às famílias e conselhos ao povo. Também agiu com muita austeridade , acabando com os excessos de bebedeira e a prostituição. Restaurada essa harmonia, o povoado foi logo crescendo, atraindo grandes multidões. Seguindo o modelo do Pe. Ibiapina, falecido em 1883, logo organizou uma irmandade leiga constituída de senhoras, as famosas beatas, sob sua inteira autoridade.

Nesse contexto é que fica famoso o Milagre que transformou a vida do lugarejo e a vida dele para sempre.Em 1º de março de 1889, ao participar de uma comunhão geral, oficiada por ele na Capela de Nossa Senhora das Dores, a beata Maria de Araujo, conhecida por Beata Mocinha,ao receber a hóstia consagrada, não pode degluti-la pois essa se transformara em sangue. O fato repetiu-se, e a fama de milagre logo se espalhou.. Pe. Cícero agiu com prudência chamando dois médicos, Dr. Marcos Madeira e Ildefonso Correia Lima e ainda o farmacêutico Joaquim Secundo Chaves, vieram testemunhar as transformações e depois assinaram atestados afirmando que o fato era inexplicável. Isso contribuiu para fortalecer no povo, no Pe. Cícero e em outros sacerdotes, a crença no milagre.Pode-se imaginar como essa notícia correu mundo.O jornalista Marcos Mendonça, crente no milagre, logo a difundiu pela imprensa. O Bispo de Fortaleza,D. Joaquim José Vieira,ficou profundamente irritado com esse fato. Pe. Cícero teve que lá ir para prestar esclarecimentos. Logo uma comissão de dois padres, Clicério da Costa Lobo e Francisco Ferreira Antero, foi nomeada pelo Bispo. Tendo lá ficado 15 dias, assistido ao milagre da hóstia, examinado a beata, logo concluíram que o fato era sobrenatural. Mas o Bispo não gostou do resultado do inquérito. Logo nomeou uma segunda comissão que agiu rapidamente (foi uma ação de apenas dois dias) que, conforme o autor Daniel Walker, sob pressão, obrigaram a beata a comungar, não havendo milagre. Logo o relatório é mandado a Roma, os padres que acreditavam no milagre tiveram que se retratar e ao Pe. Cícero coube uma punição maior : a suspensão de ordem.

O “affaire” Pe. Cícero teve ainda muitos outros desdobramentos (que posteriormente serão aqui tratados). Mas a grande verdade, é que a mensagem dele continua viva, as multidões acorrem à cidade em busca de alívio espiritual. E fala-se continuamente na reabilitação do famoso padre.

O jornalista Lira Neto, no seu livro “Padre Cícero, Poder, Fé e Guerra no Sertão”, afirma: “A excomunhão foi suspensa em 1921, mas ele permaneceu fora de suas atividades religiosas para sempre . O movimento para a sua reabilitação se deve à posição pragmática da Igreja nos últimos tempos, devido ao crescimento das Seitas Evangélicas que vêm conseguindo ‘roubar’ milhares de ovelhas do rebanho católico. Nesse cenário de crise, como abrir mão de um ícone como o Pe. Cícero, que mesmo expulso da Igreja, tem a imagem cultuada pelos católicos de todo o Brasil?”

Sebastião Heber. Prof. Adjunto de Antropologia da UNEB, da Faculdade 2 de Julho. Membro do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e da Academia Mater Salvatoris.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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