Marcelo Barros 23 de fevereiro de 2010
 

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Avatar, filme de James Cameron já é considerado não apenas o filme mais caro do Cinema, como também o mais lucrativo de todos os tempos. De fato, mesmo para quem não teve oportunidade de vê-lo em terceira dimensão (3 D), – o que o torna ainda mais belo e instigante -, sem dúvida, é sempre um filme interessante e comovente. De fato, não se pode esperar de um block-buster norte-americano algo mais profundo. Nem este filme se propõe a isso. Quer, acima de tudo, ser uma fábula com linguagem de ficção científica e com certo conteúdo ecológico e humanitário. Mesmo que fosse apenas por isso, Avatar já seria melhor do que todos os Rambos e outras obras que exaltam a vingança pessoal com todos os requintes de crueldade como se fosse heroísmo e direito dos cidadãos que perdem entes queridos vítimas da violência. Mesmo atores excelentes têm vendido seu rosto e sua arte para tornar palatáveis filmes violentos que dão legitimidade a esquadrões da morte e às arbitrariedades cometidas pelos norte-americanos em Guatánamo e outras prisões, em países por eles dominados.

Este novo filme de Cameron não deixa de ter sua dose de violência e manter a filosofia maniqueísta tão comum no Cinemão norte-americano. Nele também, as personagens se dividem em boas e más e separadas por um abismo bem maior do que a existente na vida real.

Em várias tradições espirituais do Oriente, avatar é um termo comum. Significa uma espécie de encarnação da divindade em forma humana. Na Índia, se diz que o homem Jesus de Nazaré é um avatar de Deus. No budismo tibetano, o Dalai Lama é considerado uma reencarnação do Buda da Compaixão. Isso quer dizer: pelo caminho da iluminação interior, ele é um avatar do ser humano divinizado.

No filme do Cameron, o termo avatar tomou outro significado. É uma espécie de cópia ou clone de uma pessoa humana. Em um futuro que seria a metade do século XXI, uma expedição de conquista vai a um planeta chamado Pandora. Aquele mundo é habitado por seres chamados na´vi, humanóides azulados que vivem em profunda comunhão com a natureza e têm uma civilização comunitária e espiritual. Os cientistas da tal expedição conquistadora querem espionar a tal civilização dos na´vi para melhor conquistá-los. Para isso, fazem o avatar de um soldado impossibilitado de andar para que este possa se inserir em meio aos na´vi, sem ser descoberto.

Afinal, aquele planeta contém uma substância como urânio, cobiçado pela empresa promotora da expedição.

Sem querer contar a história, para não retirar o gosto da surpresa para quem ainda quiser assistir o filme, basta lembrarmos que, como era de se esperar de um herói bom e justo, o tal avatar muda de lado e passa a defender a cultura e a civilização dos na´vi. Quem quiser ver nisso, uma parábola da conquista sofrida pelos povos indígenas tem toda a liberdade. Quem preferir vislumbrar nos na´vi a imagem de povos que ainda hoje sofrem invasões violentas por parte de governos ditos civilizados, como o dos Estados Unidos, também pode. Não custa recordar que, na língua hebraica, o termo bíblico para profeta é navi, ou nabi. Seria coincidência em meio ao uso de vários termos comuns às religiões antigas para designar seres deste mundo futuro possível?

Como se trata de um filme norte americano e comercial, o filme até permite que o público vibre com a vitória da ecologia e com a possibilidade de que os índios pobres e “primitivos” vençam a tecnologia e a prepotência dos poderosos do mundo. Oxalá que isso seja assim no mundo real em que vivemos.

Antigamente, todas as culturas desenvolviam relatos das origens e lendas que faziam parte da fé. Conforme o evangelho, Jesus gostava de anunciar o projeto divino no mundo através de histórias da vida que até hoje são atuais. Entretanto, a sociedade contemporânea tem em artes como o Cinema mananciais de belas parábolas de amor. Com toda a sua tecnologia futurista, Avatar nos recorda que todos nós temos em nosso íntimo uma dimensão amorosa que vem de Deus e não nos deixa ser apenas cópia ou reprodução de um mero consumidor e sim, ao contrário, um irmão ou Irmã dos outros seres humanos e de todo o universo.

(*) Monge beneditino, teólogo e escritor.
www.empaz.org/

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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