Ainda continuamos surpresos e abalados com a violência da tragédia que se abateu sobre o Haiti. O terremoto foi devastador. Só aos poucos será possível contabilizar as vítimas, e avaliar os estragos causados.
Tanto mais urgente se apresenta agora o desafio da solidariedade, para um país que já vivia em condições de extrema precariedade.
O apelo precisa ser respondido sobretudo pelo Brasil, em vista de duas vinculações especiais que neste episódio ligam nosso país com o Haiti.
A primeira delas é a presença do contingente do Exército Brasileiro, no comando da Força de Estabilização das Nações Unidas a serviço da manutenção da ordem no Haiti, desde 2005.
A segunda é o falecimento da Dra. Zilda Arns, que estava no Haiti em missão de ajuda humanitária, e que acabou morrendo vitimada pelo terremoto.
Este fato envolve todo o episódio com motivações impregnadas de valores humanos e sentimentos cristãos. A própria tragédia, surpreendendo a todos, acabou dignificando o testemunho de uma pessoa que dedicou toda a sua existência a serviço da vida humana, sobretudo dos mais frágeis, de que o povo haitiano é um exemplo singular.
Mártir é aquele que morre dando testemunho de sua fé. A Dra. Zilda não podia concluir de maneia mais clara o seu testemunho de caridade, do que morrendo no cumprimento de uma missão que ela abraçou com extrema tenacidade e competência, ao longo de toda a sua vida.
Com a Dra. Zilda faleceram, ao lado dela, outros quatro soldados brasileiros, integrantes do nosso Exército. Eles também se tornaram heróis, que testemunham o caráter humanitário e a postura de dignidade e de respeito que caracterizou a presença da Tropa Brasileira no Haiti, como as autoridades e o povo daquele país souberam muito bem reconhecer e valorizar.
Há dois anos, a Cáritas realizou sua assembléia no Haiti, como expressão da solidariedade de todos os países latino americanos para com o país mais pobre do continente. Parecia uma premonição da solidariedade efetiva que agora somos chamados a exercer com urgência, para socorrer as vítimas e recompor as condições mínimas de sobrevivência do povo haitiano.
A Cáritas Brasileira já se coloca a campo, para promover uma campanha nacional, fazendo apelo a todas as comunidades, para que sejam generosas em socorrer agora nossos irmãos que passam por situação tão difícil.
Mas a situação do Haiti interpela o mundo inteiro. Este país, de diversas maneiras, sentiu o peso das adversidades produzidas pelo sistema econômico e financeiro mundial. Uma medida sensata e justa seria agora o perdão imediato de toda a dívida externa do Haiti, que corresponde a 30% do seu pobre orçamento.
A responsabilidade que a comunidade mundial conferiu ao Brasil, confiando-lhe o comando da Força de Estabilização, confere agora ao nosso país a autoridade para propor e reivindicar tal medida, como gesto mínimo de solidariedade internacional.
Pensando na Dra. Zilda, nos quatro soldados brasileiros, no arcebispo da capital que também morreu sob os escombros da sua igreja, e nas milhares de vítimas anônimas deste pobre e querido país, sentimos a dor cortando nosso coração.
Que ela se traduza na participação efetiva na campanha que agora é lançada, e nas reflexões que toda tragédia humana nos leva a fazer. Também para nos perguntarmos por que o Haiti, o primeiro país a conseguir no passado sua independência, no presente se encontra em situação tão precária e tão injusta.