13 de janeiro de 2010
teóloga, professora e decana do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio.
A esperança é o tema por excelência deste tempo que antecede o Natal. O próprio nome já diz: Advento. Advento inspira pensar no que vem e, portanto, no que é esperado. Olhos postos na vinda do esperado, a humanidade deseja e suspira, e a Igreja celebra e se prepara pela oração e pela penitência.
Esperar é preciso, nos diz o tempo litúrgico e a profundidade de nossos afetos. Mas quem espera deseja alcançar o que espera. E quem espera…alcança sempre? Ou pelo menos às vezes? Inspirados pela canção de Gilberto Gil, afirmamos: “Quem espera sempre alcança/ Três vezes salve a esperança” recordando a inesquecível interpretação de Elis e Jair Rodrigues.
Os recentes episódios dos exames de ingresso no ensino superior no Brasil – notadamente os lamentáveis ocorridos com o ENEM – nos dizem, por um lado, como o esperar move mentes e corações e, por outro, como o defraudar da espera pode ser prejudicial e daninho para toda uma geração que apostara em um exame a partir do qual enxergava a construção de seu futuro profissional e que determinaria todo o desenrolar de sua vida.
Quem já terminou o segundo grau e fez o famigerado vestibular sabe toda a carga de expectativa que é posta naquela prova que funciona como um gargalo para as instituições de ensino superior brasileiras. São muitos milhares e mesmo milhões de jovens que passam muitas horas sob um sol causticante, em lugares absolutamente desconfortáveis, apostando na esperança de ingressar na universidade e iniciar o percurso em direção a um futuro melhor.
Por isso, quando acontece algo como o vazamento da prova e a evidente incompetência do Ministério da Educação para gerenciar o exame de ingresso que compromete o futuro de tantas jovens vidas, é normal acontecer uma baixa na temperatura das pessoas envolvidas e mesmo uma revolta. Os jovens começam a achar que não vale a pena investir tanto, estudar tanto, esperar tanto…começam a sentir que quem espera nem sempre alcança.
Dura experiência essa que percebe que a ética nem sempre acompanha as boas intenções e os esforços feitos com garra e empenho. Que a espera e a esperança podem tropeçar em obstáculos inesperados e não programados em seu trajeto até a realização dos sonhos daqueles que investem e trabalham para conquistar seu sonho e seu desejo. Que até o exame de ingresso na universidade pode ser objeto de roubos, golpes, manobras ilícitas e tentativas desviadas e ilegais.
No entanto, a mensagem do Advento permanece com toda a sua legitimidade. Quem espera sempre alcança. A todo Advento corresponde um Natal. Com todas as dificuldades que possa haver pelo caminho, a esperança não é em vão porque Aquele que se espera não é conquistado por nossos méritos, mas se dá em absoluta graça, para além da acanhada medida de nossas expectativas. Quem espera sempre alcança e alcança muito além do que ousou esperar.
A canção de Gilberto Gil, portanto, mais que nunca, neste Advento, mantém sua atualidade. A esperança três vezes louvada desabrocha na flor do desejo plenificado para aquele que não desanimou nem cruzou os braços em atitude fatalista.
Louvo quem espera sabendo
Que pra melhor esperar
Procede bem quem não para
De sempre mais trabalhar
Que só espera sentado
Quem se acha conformado
Os jovens que, desolados, receberam a notícia de que seu vestibular havia sido anulado por fraude e vazamento tinham duas opções: desistir e adiar o exame para o ano seguinte ou tentar novamente na próxima ocasião. Os que optaram pela última descobriram que valeu a pena sempre mais trabalhar e não se conformar.
Que o Advento nos ensine a lição nem sempre fácil de que quem espera aquilo – ou melhor Aquele – que é realmente importante, sempre alcança. E por isso: três vezes salve a esperança!!!
Maria Clara Bingemer é autora de “Deus amor: graça que habita em nós” (Editora Paulinas), entre outros livros. (wwwusers.rdc.puc-rio.br/agape)
Copyright 2009 – MARIA CLARA LUCCHETTI BINGEMER – É proibida a reprodução deste artigo em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização. Contato – MHPAL – Agência Literária ([email protected])
Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.
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