UM ENCONTRO NA UNEB DE EUNAPÓLIS

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A Uneb de Eunápolis, que é o campus XVIII, promoveu de 17 a 20/11/2009 um grande evento por conta do Dia da Consciência Negra. Seu dinâmico diretor, prof. Pedro Daniel Souza, aquiesceu à sugestão dos estudantes Fábio Luis Oliveira e Tainã Silva que apresentaram um Projeto intitulado:”Raça, Cor e Cultura Negra: a Universidade frente aos desafios contemporâneos”. Havia uma Comissão Organizadora constituída pela profª Erotides Morem, prof. Orley Germano e Stephanie Nascimento, alem dos estudantes que idealizaram o Projeto.

A Programação foi rica. O tema de abertura foi “Literatura e cultura afro-brasileira”, conferência proferida pelo professor mestre Gean Paulo Santana. Também o prof. mestre Carlos Caetano falou sobre “Turismo e Etnicidade”. A temática da data direcionou os trabalhos apresentados. De destaque foi a palestra “Preconceito e Conceitos Religiosos”.

Na programação constava uma Mesa Redonda, com o tema “Irmandade da Boa Morte:Identidade,Memória e Cultura” e que foi constituída do prof. Armando Castro ( que deu também uma palestra sobre a “Boa Morte como Patrimônio Imaterial da Bahia”), prof. Adilson Gomes, prof. Sebastião Heber e de duas irmãs da Boa Morte de Cachoeira, as senhoras Dady Barbosa e Nilza Prado.

Também fui convidado para proferir uma conferência sobre o tema “ A importância das Irmandades para a preservação da Cultura Negra”.

Iniciei mostrando como a religião no Brasil no século XVIII foi a religião das Irmandades e Confrarias . Elas, continuando a tradição portuguesa, tinham como finalidade religiosa celebrar as festas de preceito, cumprir devoções, realizar enterros cristãos, mandar celebrar missas pelos seus falecidos. Mas tinham também um objetivo social; resolver problemas no campo econômico,assistência nas doenças, ajudar nos casos de pobreza extrema. Há autores que citam que houve até Casa de Misericórdia que pertenceram a Irmandades dos negros.

Entrar nas Irmandades e Confrarias representava para os negros escravizados ou alforriados, uma ascensão social : cada Irmandade tinha sua opa, seu distintivo, muitas tinham sua igreja particular e podiam, assim, participar com distinção das procissões.
A procissão era um elemento central para se entender o catolicismo dessa época. Celebração religiosa era sinônimo de procissão. Até nas Ordenações do Reino, elas eram obrigatórias e a dispensa delas só era concedida se a pessoa habitasse a mais de uma légua ( o que em Portugal correspondia a, mais ou menos, 5 km). G. Freyre cita em Casa Grande e Senzala como a vida social circulava em torno das procissões:”Nos pátios das igrejas as procissões também eram ocasião de namoro, as moças cantando quadras a S. Gonçalo, os padres fazendo sermões com voz tremida, as mulheres chorando alto com pena de Nosso Senhor. As mulheres de luto fechado, homens de preto, havia até penitentes nus da cintura para cima”.

Bastide diz que será no interior das Irmandades que serão feitos os múltiplos sincretismos.Destruir a religião é destruir a cultura, pois elas são indissociáveis. Nessa ótica, a dos negros foi preservada enquanto salvaguardaram seus valores religiosos, através das Irmandades. A cultura negra vinda com os escravizados perdurou como tal e é diferente da dos europeus. Claro que por razões óbvias, ela não pode permanecer incólume, mas foi recriada, sem perder a matriz, mas gerando outra cultura.

Os estudiosos apontam vários motivos para a preservação das tradições afras no Brasil: a) insuficiência da catequese ( o cristianismo não teria plantado raízes profundas na alma deles);b) a organização das Irmandades; c) o caráter supersticioso dos portugueses que recorriam aos “feiticeiros” africanos ( alguns alegam que era por conta da insegurança dos trópicos…); d) muitos africanos eram prisioneiros de guerra, tinham um status social no país de origem e aqui continuavam exercendo as funções de sacerdotes ou chefes tribais.

Houve nesse encontro do campus XVIII da Uneb de Eunápolis uma apresentação do samba de roda , o que foi um momento de grande congraçamento. Alguns representantes do samba de roda de D. Dalva de Cachoeira ( dia 22/11/2009 foi aberta a sua Casa do Samba de Roda)fizeram uma bela apresentação empolgando os estudantes daquele Campus a ponto deles quererem formar um grupo de samba de roda a ser desenvolvido naquela região.

Sebastião Heber. Professor Adjunto de Antropologia da Uneb, da Faculdade 2 de Julho, da Cairu, Membro do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e da Academia Mater Salvatoris.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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