20 de outubro de 2009
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“O amor é um sentimento improvável, que desperta não sei de onde e nem sei porquê”
No ponto de ônibus.
Um rapaz se aproxima.
– Oi. Licença. O Bosque da Paz já passou?
A moça parada próxima ao meio-fio responde.
– Já.
– Que pena.– Lamenta desolado tirando o boné e passando a mão nos negros cabelos cacheados. O suor descendo pelo canto do rosto. Era um daqueles dias quentes.
– Não demora passa outro.
– Viu se o Campo das Flores passou também? – Questiona o rapaz.
– Não ainda não. Estou esperando ele também. Pode ficar tranqüilo, está quase no horário dele.
– Menos mal.
Ele se aproxima.Tenta afugentar o calor com o boné.
– Tá calor né?
– Demais …
Ele pára e observa a menina magrinha, de calça jeans, camiseta branca, all star desbotado, cabelos castanhos presos num rabo de cavalo. Fixa o olhar nos livros em suas mãos.
– André Vianco?
Ela o encara sem entender. Recorda-se das obras que carrega.
– Sim, sim. – Consente.
– Gosta?
– Comecei a ler há poucos dias. Bom … é até bacana.
– Gostou ou não?
– Estou acostumada à literatura estrangeira. Confesso que preciso ler mais autores nacionais.
– Ele é o cara! Me amarro nos livros dele. Você vai gostar. Vai ver ainda não pegou o fio da história.
– Vai ver é isso. – Concordou.
– Mas porque Vianco se não gosta dos escritores brasileiros?
– Não disse isso.
– Você acabou de afirmar, linda.
– Não foi bem assim, mas tudo bem. Não vamos discutir.
– Sim.
– Decidi fazer um contraponto a Stephanie Meyer. Já ouviu falar?
– Já sim,mas não me empolguei para ler.
– Por quê?
– Vampiros gostam de atacar humanos e não de correr atrás de gazelas e leões da montanha.
– Então já leu alguma coisa?
– Um resumo confesso.
Ela sorri.
– Mas só isso. Entre o Cullen e o Samuel, prefiro o Samuel do ‘Senhor da Chuva’.
Ela observa a rua.
Mais pessoas agora se aglomeram no ponto de ônibus.
– Gosta de The Clash?
– Nunca ouvi. – Responde a moça.
– U2?
– Adoro U2! – Diz extasiada. – E você? Gosta?
– Mais ou menos. Você tem cara de quem gosta do Bono mesmo.
– Porque?
– Esquece. – Pede ele.
Sorriem.
– Gosta de alguma banda nacional?
– Não sou muito fã. Acho que os caras brasileiros precisam evoluir um pouco mais. Nada contra, mas nesse ponto fico com os estrangeiros. É que nem você e seus livros. O ônibus para.
Os passageiros sobem.
Eles são os últimos.
Sentam-se em um banco no meio do veículo.
– Gosta de filmes? – Pergunta ela.
– Depende da história.
– Hum…
– Você gosta de anime? Mangá?
– Tenho um amigo que gosta. Já vi alguns na casa dele. Têm alguns interessantes, mas não guardei nenhum de cabeça.
– Voltemos a falar de livros então?
– Certo.
– Me deixa pensar num livro …
Ela interrompe.
– Você já leu Criança 44?
– Ainda não. De quem é?
– Não me lembro o nome do autor, é um russo. Digita o nome no Google que aparece.
– Tá bom.
– É um suspense. Acho que você vai gostar. Espiões, guerra fria, assassinatos na linha do trem.
– Ta aí. Vou procurar.
Os dois observam a paisagem que passa pela janela do ônibus. Silêncio.
– Pedro.
– Bianca.
Sem formalidades.
– Você é legal.
Ela sorri tímida.
– Você também.
– Tenho que ir.
– Até outra hora então.
– A gente se vê?
– Se esbarra por aí … quem sabe na parada … quem sabe no ônibus…
– Isso soa filosófico.
Ele se aproxima para dar um beijo no rosto dela. Uma despedida. Num gesto impreciso os lábios se tocam. Um breve toque, um selinho.
– Tchau.
– Tchau.
Ele levanta e vai embora. Desce. Caminha sem olhar pra trás louco de vontade de fazer o contrário, de dar um tchauzinho, de sorrir mais uma vez pra ela. Mas acha melhor não. Teme parecer exibido.
O ônibus segue viagem. Ela abre de volta o livro. Volta à leitura. Olha pela janela e vê a silhueta de um rapaz de boné sumir entre os postes e estabelecimentos comerciais.
A vida segue …
… Se encontrariam no dia seguinte, na semana, no mês, no ano até o dia em que ficariam juntos para sempre.
Obs: Imagem enviada pela autora.
Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.
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