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“Você sabe como as pulgas são treinadas?”, perguntou o palhaço ao garoto que adorava assistir o circo de pulgas. “Não”, respondeu o garoto com muita curiosidade. “É muito simples. As pulgas possuem o costume de pular cerca de um metro e meio. Se desejamos que elas pulem somente 10 centímetros, nós devemos prendê-las em um recipiente de 10 centímetros e cobri-lo com uma tampa. Assim, as pulgas começam a fazer uma experiência muito dolorosa. Elas pulam e batem com a cabeça na tampa do recipiente. Como a maioria das pulgas não é masoquistas, depois de um determinado tempo elas começam a pular somente até a tampa do recipiente. Depois de acostumadas a pular somente nesta altura, podemos tirar a tampa. Apesar de poderem pular um metro e meio, elas não passarão de 10 centímetros.”

Os seres humanos se parecem, muitas vezes, com as pulgas. Nós possuímos uma imensa força interior, capacidades ilimitadas que nos fazem ir além dos atuais limites, somos capazes de enfrentar qualquer tipo de “tempestade” em nossa vida e recriar nossa realidade. Porém, apesar de nascermos com esta força divina, esta pequena “semente de mostarda” que pode se transformar em uma enorme árvore, durante nosso desenvolvimento, através de um processo de educação, vamos sendo podados em nossas iniciativas, vamos aprendendo a sentir culpa diante das experiências ruins e assimilando o peso da palavra NÃO. Aos poucos, por uma educação muitas vezes castradora e moralista, vamos “domesticando” nossa força interior, nossa criatividade, nossa capacidade de fazer o bem, e quando nos tornamos adultos prestamos muito mais atenção ao lado negativo da vida do que no prazer que ela pode oferecer, nos desvalorizamos e deixamos de acreditar em nós mesmos, em outras palavras, aumentamos a nossa sensação de medo. O medo é falta de fé. Muitas vezes confundimos fé com o domínio de respostas que não podem ser comprovadas racionalmente. Esta noção de fé surge, por exemplo, entre os cristãos, pelo mau uso da famosa cartilha de catecismo ou por um conhecimento superficial da Bíblia. Ela traz segurança na vida e geralmente constitui-se em uma carteirinha para pertencer a um grupo de pessoas que se auto-nomeiam “beati possidentes”: os felizes possuidores da correta fé, os eleitos de Deus. Entre estes escolhidos não há questionamentos, dúvidas ou crises, a certeza é sinônimo de fé e a segurança é a plataforma para a paz. Nesta compreensão de fé, Deus transforma-se, geralmente, em um ídolo no sentido dos profetas do Antigo Testamento, ou seja, Deus nada mais é que uma criatura construída pelo ser humano. Neste ídolo, o homem deposita todos os seus sonhos como também toda a disciplina que necessita para se manter vivo. Aqui surge, por exemplo, a visão de Deus como um pai severo que dá ao ser humano segurança e compensa suas fraquezas. A fé, porém, é um fenômeno que existe antes de qualquer idéia ou pensamento. Ela é uma força interior com a qual nascemos e através da qual podemos nos desenvolver. Diariamente nos “jogamos” nas mãos de terceiros e confiamos plenamente em sua competência, honestidade e boa vontade. Ao almoçarmos em um restaurante, ao comprarmos o leite, a carne, o pão, irmos ao dentista ou ao médico, viajarmos de ônibus ou avião, confiamos plenamente nos outros e arriscamos, de certa forma, nossa vida. Em outras palavras, possuímos naturalmente uma coragem de viver. À esta postura de coragem diante da vida damos o nome de fé. Esta coragem de viver é a primeira manifestação da fé, ela é a fé como ato (fides qua). Neste sentido, todos os seres humanos nascem com fé. Esta pode existir diante de pessoas, do mundo e se desenvolver em direção a um ser transcendente, a Deus. Quando possuímos uma fé ato em relação à Deus, surge a segunda manifestação de fé, ou seja, a fé como conteúdo racional (fides quae). Esta geralmente tem sua origem em uma revelação divina e se desenvolve através de uma teologia. Para os cristãos, por exemplo, o conteúdo da fé é a Boa Nova revelada por Jesus Cristo. Esta deve alimentar a fé ato. Como aquele que gera a vida, a forma efetiva de discurso sobre Deus está na exaltação e no desenvolvimento do que há de positivo no ser humano e no universo. Como afirma mestre Eckhart, Cristo nasce em nós mesmos continuamente. “Não podemos aguardar que os tempos se modifiquem e nós nos modifiquemos junto, por uma revolução que chegue e nos leve em sua marcha. Nós mesmos somos o futuro. Nós somos a revolução” (Beatrice Bruteau).

 

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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