UMA AÇÃO DE GRAÇAS

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A igreja da Conceição do Monte, em Cachoeira, abriga uma das mais tradicionais irmandades daquela cidade.

De acordo com a Ficha Catalográfica de Monumentos, constatam-se as datas: 1745 – Fica pronta a casa de oração que alguns devotos levantaram no Monte consagrado à Senhora da Conceição; 1780 – É criada a Irmandade da Conceição do Monte; 1784 – O Capitão José Gonçalves Fiúza, Sargento-Mor da Vila de Cachoeira e proprietário do Engenho S. Domingos do Ponto das Garças, manda edificar a atual igreja no mesmo sítio da casa de oração; 1796 – Sob a administração de Manoel Freire de Almeida foram iniciadas obras para ”aformosear“ o templo; 1846 – Só nesse ano é que foi concluída a torre, graças ao zelo dos mesários da irmandade, sobretudo do devoto Antonio João Bellas; 1853 – É reformado pela última vez o Compromisso da Irmandade; 1981- no dia 20 de março foram roubadas todas as imagens, mas posteriormente foram recuperadas.
É lá que vou celebrar os meus 30 anos de ordenação sacerdotal a convite daquela irmandade. Foi o Prior Isaac Tito e o Secretário, Adilson Gomes, com aprovação da Mesa Diretora que fizeram o convite. A Missa será no dia 26/09, às 10:30, com a homilia proferida pelo orador renomado Mons Gaspar Sadoc. E essa celebração irá trazer muitas recordações pois foi lá em Olinda,em 1979, através das mãos de D. Helder Câmara, que recebi o sacerdócio. Presente, naturalmente, além de muitos amigos, a minha família. Um ano depois, papai falecia – neste ano estaria completando 90 anos. Mas “tudo é graça”, como dizia Tereza de Jesus, a Pequena de Lisieux.

O sacerdócio sempre ultrapassa os limites de quem o recebe. É dom para ser distribuído. Claro que ele brota do sacerdócio comum dos fiéis, fruto do batismo. Isso tudo foi reafirmado pela Constituição do Vaticano II, a famosa Lumen Gentium. E isso trouxe interrogações para muitos padres que não estavam acostumados com a verdade dessa afirmação. Sentiram-se enfraquecidos no seu ministério, pois com essa consciência do sacerdócio comum, muitas atividades da igreja passaram para os leigos, homens e mulheres, isto é, os não-padres. O sacerdócio do padre é decorrente do sacerdócio comum, mas é um ministério sacramental especial. Ele é chamado a estar muito próximo ao povo, como amigo, mas como sacerdote, isto é, continuando as pegadas e os gestos salvadores do Senhor Jesus.

Quando se olha para a história da Igreja Cristã, vê-se claramente que os apóstolos e a comunidade de fiéis fazem parte da estrutura inalienável e original dessa mesma Igreja. Eles não apenas tiveram auxiliares naquele ministério específico, mas para que a missão que lhes fora entregue continuasse após a morte deles, foi confiado aos colaboradores imediatos a tarefa de continuar a obra. Aquela estrutura essencial da Igreja, constituída pelo rebanho e pelos pastores para isso designados segundo a Tradição (com “t” maiúsculo, que significa a “entrega” daquela verdade e não o tradicionalismo), foi e permanece como algo normativo.

O ministério sacerdotal torna perene a obra essencial dos apóstolos. O sacerdócio é sinal do desígnio proveniente de Deus. Ele torna presente, sacramentalmente, o Cristo, Salvador do homem e da mulher de forma completa. O sacerdócio é, portanto, a garantia da primeira proclamação do evangelho.

Como definir o sacerdote? É um homem a serviço da comunhão. Essa consciência moldou o Novo Testamento. O apóstolo Paulo a proclama vivamente em I Coríntios 4,1: ”Consideram-nos os homens como servidores de Cristo e administradores dos mistérios de Deus”. E esse administrar é servir, é colocar-se a caminho do próximo, sobretudo do mais necessitado. O lava-pés da Última Ceia foi um paradigma desse serviço. Não se pode deixar de sublinhar que alguns apóstolos se espantaram com esse gesto. Até Pedro, chamado aos píncaros da missão, recusou tal gesto. Portanto, no sacerdócio, a autoridade que o sacramento confere, não pode ser confundido com autoritarismo – o que muitas vezes acontece – mas é um serviço da autoridade. O Papa João Paulo II na sua Carta aos Sacerdotes , em 1986, manifesta essa preocupação: ”O sacerdócio ministerial é herança, vocação e a nossa graça. Marca toda a nossa vida com o selo de um serviço: a salvação de todos”.

S. Francisco é sempre um parâmetro. Mesmo não tendo sido padre, sua vida, sua mensagem representa um direcionamento. Por humildade, chamou a seus irmãos de Frades Menores e não teve outro cuidado que o de colocar seus passos no caminho de Cristo para viver, assim, o mistério das Bem-Aventuranças. A sua grande Oração representa um direcionamento para a vida do cristão e, especialmente, do padre:

“Senhor, fazei-me um instrumento de vossa paz ( … )
Ó Mestre,
Fazei que eu procure mais, consolar, que ser consolado,compreender, que ser compreendido, amar , que ser amado,
Pois, é dando que se recebe,
É perdoando, que se é perdoado, e é morrendo que se vive
Para a vida eterna. Amém.”

Sebastião Heber Vieira Costa. Professor de Antropologia da Uneb, da Cairu, da Faculdade 2 de Julho. É membro da Academia Mater Salvatoris e do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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