Uziel Santana
Tassos Lycurgo
Anna Helena Santana

“As (sub)culturas latentes e fundantes da condição humana pós-moderna”

O cerne e propósito essencial desta série de artigos que iniciaremos a partir deste domingo – e assim o será nos próximos – é dialogar e, a partir disso, refletirmos, junto com você, leitor, sobre o contexto social em que vivemos e os fundamentos culturais e valorativos que o determinam e que, por assim ser, conformam e constituem o denominado (in)consciente individual e coletivo do nosso ser e da nossa sociedade.

Desse modo, a idéia, nestes diálogos refletidos e reflexivos, é tentarmos, pelo prisma Jurídico-Social, Filosófico e Teológico, entender e compreender – e como conseqüente lógico e necessário disso, desvelar para os nossos leitores – os porquês e as razões de sermos quem nós somos, na teia de relações sociais nas quais estamos inseridos, e, assim, compreendermos um pouco as mazelas e distúrbios do comportamento individual, social e institucional que, recorrentemente, encontramos hoje na nossa sociedade.

O leitmotiv – verdadeiro fio condutor – das nossas interlocuções aqui escritas é tentar compreender, de modo analítico e abalizado, porque o homem, no atual contexto da denominada pós-modernidade, estabeleceu-se – sem as bases e alicerces necessários – como o centro e a medida de todas as coisas. Compreender porque, no atual estágio social e individual da humanidade, o “em si mesmo”, o “centro e medida de todas as coisas” tornou o ser humano um ser “independente”, um ser sem expectativas, sem ideal, sem propósito eterno, porque, como se afirma, o que vale é o carpe diem e a satisfação diária e imediata dos “meus interesses pessoais”, custe o que custar. E quando eu, ser humano pós-moderno, satisfaço os interesses que estão no meu coração, eu, de pronto, vou em busca de outros interesses, de modo incessante, num verdadeiro ciclo prisional e oprimente. E, assim, a vida passa sem propósito existencial algum. Tudo isso porque, como veremos nestes diálogos reflexivos, a denominada sociedade pós-moderna enlaçou o ser humano na sua própria fraqueza, no seu próprio egoísmo, no seu próprio hedonismo, no seu próprio relativismo cultural e ético. E o resultado de toda esta inversão de valores é a deturpação moral em que vivemos, a letargia social na qual nos encontramos e o individualismo exacerbado que cultivamos e ensinamos aos nossos filhos.

Esse é o objeto e esses são os objetivos a que nos propomos realizar nesta série de diálogos reflexivos. Porque, em assim sendo, pensamos estar dando a nossa contribuição, mesmo que tão-somente intelectual, para que nós atores, passivos e ativos, desta condição social pós-moderna, possamos nos libertar dos vários males que muitas vezes nos aprisionam existencialmente sem que, ao menos, demo-nos conta deles. Para isso, convidamos, para a consecução das interlocuções e reflexões que a temática nos exige, um Filósofo e uma Teóloga. Assim o fizemos porque, como veremos, é a partir do pensamento filosófico-racionalista do século XVIII que o homem – especialmente no mundo ocidental – avocou para si a pretensão de ser o centro e a medida de todas as coisas, dissociando-se, volitivamente, de toda a concepção cristã de que, em verdade, há um Deus acima de todas as coisas, das que são – as visíveis – e das que não são – as invisíveis –, como aponta a Teologia.

O Filósofo que convidamos para participar das interlocuções e reflexões é o Prof. Dr. Tassos Lycurgo o qual tem uma formação eclética – com graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado em diversos seguimentos do saber científico e filosófico – que, por certo, contribuirá para que possamos pensar e, ao final, tirar ilações a respeito das debilidades e potencialidades da condição humana pós-moderna. Por sua vez, para também participar dessas interlocuções e reflexões de vida individual e social a que nos propomos realizar, convidamos a Teóloga Anna Helena Santana. Ela tem formação acadêmica em Teologia, onde faz mestrado na área. Assim também, como teóloga cristã, tem como predileção investigativa, o estudo das línguas originais em que foi escrita a Bíblia, especialmente, a língua hebraica, fato esse que pode em muito contribuir para desmitificarmos aqui, também, nesses diálogos reflexivos, algumas inverdades na interpretação dos textos sagrados.

Da nossa parte, como jurista de olhar holístico, a nossa contribuição tentará ser no sentido de entender os fundamentos valorativos e ideológicos que nos levaram ao estabelecimento de uma sociedade onde, por exemplo, o preceito da lei – o texto da lei – é mais importante que o valor moral que recebemos, de geração em geração, dos nossos parentes antepassados. Fatos como esse, ao analisarmos, mostrar-nos-ão que precisamos, realmente, refletir sobre – como já escrevi uma vez – quem nós éramos, quem nós somos e quem nós estamos nos tornando.

Os diálogos que travaremos com Tassos Lycurgo e Anna Helena Santana tratarão do que denominamos na epígrafe deste primeiro artigo de as (sub)culturas latentes e fundantes da condição humana pós-moderna. E que (sub)culturas seriam essas que, mesmo latentemente, fundamentam nosso ser existencial e relacional neste contexto pós-moderno? São várias: a Cultura do Relativismo, que afirma não mais existirem verdades absolutas; a Cultura do Hedonismo, que afirma que o prazer está acima de todas as coisas e que, por assim ser, a dor e o sofrimento não nos trazem bem algum; a Cultura do Descarte, que faz com que descartemos, facilmente, tudo e todos, por uma simples contrariedade; a Cultura do Individualismo, que colocou o ser humano, na sua individualidade, como o bem, o belo e a verdade; a Cultura do Medo e da Violência, condição na qual nos encontramos nas ruas e nas esquinas no relacionamento com os nossos semelhantes que não conhecemos – todos potenciais criminosos, por assim ser; a Cultura da Arrogância, onde o ser humano, ao se colocar como medida de todas as coisas, não se deixa mais ser ensinável pelo próximo; a Cultura da Insubmissão, onde, tendo em vista a exacerbação da soberba humana, ninguém se submete mais a ninguém, a não ser “à força”, numa relação de trabalho; e, por último, a Cultura do Banal e do Profano, que retira das pessoas, e dos seus entornos, a essencialidade da vida. É o caso, por exemplo, das relações que se estabelecem a partir de redes como o Twitter, onde as banalidades da vida uns dos outros são aguardadas ansiosamente pelos expectadores da vida privada e alheia. Todas essas subculturas – e outros vieses da condição humana atual – serão analisadas e refletidas por nós, um Jurista, um Filósofo e uma Teóloga, nesta série de artigos.

E para introduzir a temática, fizemos aos nossos interlocutores, Tassos e Anna, o seguinte questionamento: “teológica e filosoficamente, o que é a condição pós-moderna do homem?”

ANNA: “Em primeiro lugar, temos que procurar definir o que é Teologia. Segundo Berkhof, Teologia é o conhecimento sistematizado de Deus, de quem, e por meio de quem, e para quem, são todas as coisas. Assim, partindo desse pressuposto conceitual, para a teologia, tudo gira em torno da pessoa de Deus e de como Ele se relaciona com o homem, nas mais diversas áreas de sua existência. Atualmente, porém, a cultura pós-moderna lança um grande desafio à Teologia, visto que, nesta cultura, é próprio se afirmar que não existe uma verdade absoluta, de tal modo que tudo, inclusive Deus e o conhecimento de Deus, deve ser relativizado. Deste modo, a experiência e a interpretação pessoal das Escrituras sobrepõem a ortodoxia e os modos clássicos do conhecimento de Deus, por considerá-los autoritários. Assim é que, até mesmo na Teologia, tais influxos pós-modernos têm levado à construção teórica de uma Teologia firmada no pragmatismo, funcionalismo e no relativismo. É isso, por exemplo, que faz com que, hoje, o nosso culto a Deus seja constituído por elementos que, na sua aparência, e no seu apelo mercadológico, nada tem a ver com Ele. Fatos como esse comentaremos e analisaremos a partir dos próximos artigos”.

A resposta do filósofo Tassos será o leitmotiv inicial do artigo do próximo domingo, quando falaremos, ainda conceitualmente, sobre a cultura pós-moderna e introduziremos a temática da (sub)Cultura do Relativismo e suas influências sobre nós e sobre a nossa sociedade.

Uziel Santana (Professor da UFS e Advogado – www.uzielsantana.pro.br

Tassos Lycurgo (Filósofo – www.lycurgo.org)

Anna Helena Santana (Teóloga – [email protected])

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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