Malu Nogueira 30 de junho de 2009

 

Tem coisa melhor do que dizer que nasceu no sertão?
Que é um cabra da peste, não pisa em rastro de corno, nem tem medo de lobisomem?
Que come feijão, farinha seca, rapadura e tira uma madorna, numa rede de punho puído?
Que só tem uma camisa e uma calça e se acha mesmo assim o mais bem vestido do mundo? Não se importa de andar a pé quilômetros e quilômetros para prosear com um amigo?
Matuto orgulhoso do chão de sol inclemente, que o alimenta, onde tem sua casa de taipa, um fogão de trempe, uma corda com carne seca, tamboretes para as visitas, um candeeiro, uma lata de óleo usada como chaleira? Uma porta cheia de buracos, um cachorro magro e pulguento, um par de sandálias de pneu velho e um sorriso desdentado e sincero para acolher quem quer que chegue ao seu alpendre?
Um ser despojado de malícia, que não entende por que o homem da cidade tem tanta empáfia e menosprezo por aqueles que, como ele, só querem um pouco para ser feliz.
Ele entende, na sua simplicidade, que a arrogância desses cidadãos produz, no homem, uma limitação de suas qualidades racionais.
O matuto sertanejo dispensa bajulações e balelas. Fala arrastado e manso, sem igual em outros rincões.
O matuto que se preza não dispensa uma viola, uma cantoria noite afora, um aboio ao entardecer, um cigarro de fumo da terra, fedorento de matar. Um chapéu de palha velho. Um oratório para rezar. Um cavalo velho e magro, mas que lhe serve de montaria. Um não-viver sem uma boa cusparada, um par de mãos calosas e sujas. Enfim, um homem completo e feliz, pois, ao derredor dele, está o seu mundo completo.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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