Djanira Silva 12 de maio de 2009


Tudo quanto escrevo é dor não é queixa.
A manhã está escurecida. As pancadas de vento castigam as árvores. O pensamento é culpado pelos desvios e pelas paradas.
Igual a qualquer pessoa normal, também tenho sonhos. Realizados são problemas.
Quem me garante que existe começo? Fim, sei que existe, às vezes choro.
As pessoas brigam, discutem, depois pensam que tudo passou. Desconhecem o veneno inoculado nas palavras, nos gestos, nos sorrisos, nas passagens do tempo.
Às vezes quero cantar e tenho medo de desafinar o mundo, quando falo ele gagueja, parece agonizar, então, sorrio para sentir a pulsação das minhas dores, elas caminham feito formigas sob a pele e para esquecê-las castigo-as com o engano de quem pensa que é feliz. É um jeito louco de sofrer, uma maneira estranha de enganar as idéias e então rio, rio e escrevo ao redor das tristezas amortalhadas dentro de mim. Sobre a mesa, o papel, as linhas, as linhas tortas onde Deus escreve os seus desejos certos. Nas retas tento me equilibrar.
O mundo está cheio de linhas. A primeira que conheci foi a do horizonte, limitou o meu olhar, deu asas à imaginação, abismo de luz onde à tardinha, cheia de saudade, eu via o sol se esconder.
Mergulho num mundo de sonhos e imagens. Perambulo por terras desconhecidas atravesso a linha que separa a terra do mar e a realidade do sonho. Na linha do trem o apito saudoso e melancólico me carrega pelas estradas de onde não sei se voltarei num vôo de solidão e medo. À noite, adormeço na linha horizontal da cama onde repasso, a cada noite as falas dos papéis que represento. Em quantas retas se divide o mundo e em quantas curvas ele se perde?
Cresci e caminhei nas linhas traçadas por quem sabia enganar a vida. As mais difíceis, as linhas de conduta.
Ensinaram-me a ler. Sempre nas linhas. Nelas me ensinaram a pendurar letras e números, equilibrar palavras. Os dedos cheios de liberdade, de movimentos livres, recusavam-se a obedecer. Dessas, segui por outras sem saber que meu caminho estaria sempre marcado por elas.
Diante do piano mais um exercício de obediência. Diante dos olhos linhas, espaços, notas que nelas se seguravam e neles se aconchegavam.
Preciso controlar os fantasmas de idéias mal assombradas. Sinto que já não há muito o que dizer. Criar? Não sei se ainda existem idéias novas. Tanta coisa já foi dita. Penso no perigo de me repetir ou repetir os outros nestas linhas do meu caderno, cheias de armadilhas.
Aguarda-me a qualquer hora, a linha horizontal onde deporei as armas e entregarei a vida.

Obs: Imagem enviada pela autora.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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