DISCURSO DO DESEMBARGADOR VLADIMIR SOUZA CARVALHO (*)
[email protected]

No início era o verde, verde que defluia das matas, dos arbustos e da vegetação rasteira, verde que parecia nascer na Serra e dela descia, subindo por outras serras, a se espraiar por todo o território, até onde a vista alcançasse e não pudesse alcançar. Era o verde que só deixava de ser verde quando a terra se abria para permitir que um rio corresse por suas entranhas e os riachos, ainda que temporários, muitos, tornassem mais alentadores os sonhos de colonização. No meio de tudo, como senhora e rainha, imponente e estática, a Serra, a grande Serra, a maior de todas, testemunha muda da conquista que a região ia ser alvo, Serra que só se vestia, como ainda se veste, do azul pálido, quando vista de longe.

Neste verde, que a formatação histórica reservou para o ser o centro da futura Província de Sergipe Del Rei, seria erguida, por obra e graça do Reino Português, fruto da política de interiorização, a Vila de Itabaiana. Foi a primeira de todas, pioneira, umbilicada a de Lagarto, mas instalada antes desta, no sítio que a Irmandade das Almas do Fogo do Purgatório, criada na era de 1665, adquirira para ser a sede da Igreja.

A primeira vila sergipana vai se arrastar pequena e miúda, abafada e cercada da portentosa mata que seria, depois, denominada de Matas de Itabaiana, a não oferecer nenhum atrativo para o proprietário rural, que habitava os seus arredores, de forma a conviver com o atraso por mais de dois séculos, em um isolamento que, se de um lado, no início do século XIX, tornava a sua pequena população urbana a mais pobre de toda a Província sergipana, por outro, legavalhe a auto-suficiência.

É de Francisco Antonio de Carvalho Lima Júnior, primeiro historiador da terra, Carvalho como Sebrão, sobrinho, seu segundo historiador e meu tio-avô, Carvalho como eu sou, que, sem o fôlego destes, também dou meus mergulhos na história de Itabaiana, a afirmação, na memorável e fundamental MONOGRAFIA HISTÓRICA DO MUNICÍPIO DE ITABAIANA, que tudo já possuía o itabaianista de um século passado a mais, de modo a poder viver independente do mundo se dele estivesse separado por uma muralha inexpugnável.

A Vila de Itabaiana sai primeiro na cronologia dos tempos, mas se esbarra em dificuldades de todas as ordens, perdendo espaço para outros centros urbanos que lhe tomam a frente, a tal ponto que, uma vez elevada à categoria de cidade, só contava com sete ruas, uma praça e duas em formação, vinte e um sobrados, e casas de taipa e telha.

O problema, Senhor Presidente, é que Itabaiana, já agora adornada pelos mantos de cidade, continuava a dormir, como nos tempos de vila, não por ato de letargia, porque o povo desta terra sempre foi, e continua sendo, guerreiro e trabalhador, mas por uma questão de estratégia, aguardando o melhor momento para despertar o gigante adormecido, que só se liberta do sono nos meados do século XX, quando, enfim, Itabaiana impõe a posição de liderança econômica, via de um imenso e produtivo comércio, que, antes, se dispersou nos caçuás dos cavalos, a desbravar o Nordeste, desde o sertão baiano ao litoral cearense, descendo até o Rio Tietê, na Província de São Paulo.

O gigante se acorda e sai para a luta, fazendo com que o vento do isolamento no meio da Província, que secularmente lhe fora desfavorável, agora se torne um dos fortes aliados. Itabaiana estende-se no centro, com estradas para diversos municípios vizinhos e não vizinhos, significando, também, entradas e saídas, favorecendo, de forma incontestável, a sua escolha para ser sede de uma vara da Justiça Federal.

A Vara da Justiça Federal em Itabaiana vai ser colocada no papel de projeto, já neste século XXI, na presidência do eminente desembargador José Maria Lucena de Oliveira, transformando-se em lei, instalada, primeira do que todas, dentro da 5a. Região, na presidência da desembargadora Margarida Cantarelli, recifense de escol, que, por uma dessas coincidências da vida, traz nas veias um pouco de sangue sergipano, especificamente de Capela, de onde se deslocou o seu trisavô Antonio Diniz Barreto, professor, para a Vila de Itabaiana, onde nasceria José Diniz Barreto, seu bisavô, que, estudando em Recife, se forma em Direito e se torna professor da Faculdade de Direito de Recife, cortando seus vínculos, em definitivo, com a terra natal. Ou seja, seria uma bisneta de um itabaianense a honra de presidir a instalação da 6a. Vara, que, por seu turno, teria em mim o seu primeiro magistrado, na realização das primeiras audiências, na confecção de seus primeiros despachos e sentenças. A 6a. Vara nascia, assim, bem bafejada pelo sangue itabaianense.

A inauguração, hoje, desta sede, sede da 6a. Vara da Justiça Federal da Seção Judiciária de Sergipe, em meio a esta área, antes rural, agora urbana, sem perder, ainda, a tonalidade da agricultura que a cerca em algum ponto, é a mais vibrante prova de dinamismo que Itabaiana assiste e presencia, pela coragem da Justiça Federal sergipana de trazer para este local o seu Fórum, na certeza, desde o início e agora concretizada, de ser o Fórum um veículo também de atração para o centro urbano, que, com ele, com o Fórum, cresce e se estica, de maneira que dois coelhos são mortos com uma só paulada, ou seja, a Justiça Federal inaugura sua moderna e definitiva sede nesta cidade, ao tempo em que se veste de atração para puxar o centro urbano até os seus pés e ao seu redor. O terreno, antes encravado, ganha acesso próprio, materializado na avenida aberta.

A Justiça Federal ganha um Fórum condigno com o seu papel e importância, os servidores se distribuem em espaço maior, o jurisdicionado se vê dentro de um prédio traçado para ser um Fórum, e a cidade de Itabaiana cresce, em uma nova vitória do gigante acordado. Itabaianense, de berço e de espírito, pesquisador e divulgador de sua história e de aspectos de seu folclore, inspirando-me em muitos fatos que presenciei e tive notícia para bolar aqui e ali algum conto ou artigo, alio – ao título de alguns dos meus livros, SANTAS ALMAS DE ITABAIANA GRANDE, O CAXANGÁ NA HISTÓRIA DE ITABAIANA, A REPÚBLICA VELHA EM ITABAIANA, APELIDOS EM ITABAIANA, ADIVINHAS SERGIPANAS, vôos em seu passado e retrato dos costumes da sua gente, – alio a minha condição de magistrado federal, para, em um casamento perfeito, viver a realidade deste Fórum, um Fórum da Justiça Federal, da qual sou servidor esforçado e abnegado deste os idos de agosto de 1970 até os dias de hoje, com um hiato apenas de seis anos no toga de juiz de direito, Forum plantado em Itabaiana, da qual me coloco como arquivista de seu passado, arranchando-me no meio da Justiça Federal e de Itabaiana, como elo e marco, de maneira a, modestamente, fazer, com meu nome, da dupla nascer um trio, ao ver este mesmo nome, bolado por meu pai há tantos e tantos janeiros passados, crismando este Fórum, ainda que temporariamente, se for o caso, para a minha maior alegria.

Vejo, Senhor Presidente, esta homenagem, que nasceu do juiz Carlos Rebelo Júnior, ao despertar a sociedade civil de Itabaiana para tal empreitada, como um ato de justiça a minha geração, geração aqui nascida e criada, geração de bravos estudantes que não ficaram nos bancos da praça, nem nas conversas de esquinas, mas, arregaçaram as mangas e foram à luta, buscar seu próprio espaço, procurando ver e vencer, geração da qual fazem parte Abrahão Crispim de Souza, Adelmo Pelágio de Andrade, Adson Araújo Mendonça, Alberto Nogueira Silva, Antonio Bertrand de Góis, Antonio Carlos Fontes, Antonio Francisco de Jesus, Antonio Francisco de Meneses, Antonio José de Góis, Antonio José de Souza, Antonio Melo Araújo, Antonio Menezes Santos, Antonio Noan de Menezes Silva, Antonio Samarone Santana, Arlindo Alves dos Santos, Arnaldo Bispo de Lima, Átalo Crispim de Souza, Eduardo Tavares Silveira, Evilásio Andrade, Francisco Máximo de Jesus, Gentil Teles de Andrade, Gilberto Fonseca de Jesus, Guilhermino Pinheiro Noronha, Ivan José de Góis, João Bosco Souza Carvalho, João Santana Menezes, Jorge Roberto Mesquita Silveira, José Agnaldo Santana, José Airton Peixoto, José Aloísio Siqueira, José Antonio do Nascimento, José Arnaldo Alves dos Santos, José Arnaldo Machado, José Arnaldo Nascimento, José Arnaldo Silva de Jesus, José Augusto Alves dos Santos, José Augusto Andrade, José Augusto Machado, José Augusto Nascimento, José Augusto Siqueira, José Benjamin de Oliveira, José Carlos Machado, José Carlos Menezes, José Costa Almeida, José Edson Pereira Lima, José Elio Lima, José Geraldo Pereira Lima, José Geraldo Santana, José Lima Filho, José Luciano Góis de Oliveira, José Luiz de Oliveira, José Luiz Machado, José Marcondes de Jesus, José Mesquita da Silveira Neto, José Nilson Machado, José Raimundo de Araújo, José Rivaldo Lima, José Rivadálvio Lima, José Roberto de Góis, José Ronaldo Lima, José Siqueira Neto, José Valde dos Anjos, José Wilson Carvalho Passos, José Wilson Machado, Josemir Andrade de Oliveira, Josias Máximo de Jesus, Luciano Alves dos Santos, Luciano Oliveira, Luiz Alberto Siqueira, Luiz Antonio de Araújo Mendonça, Luiz Antonio Oliveira Machado, Luiz Carlos Andrade, Paulo Augusto Menezes Santos, Ricardo Silveira de Oliveira, Roberto Fonseca de Jesus, Serapião Antonio de Góis Filho e Valter Pinheiro Noronha, entre outros, e também aqueles já envoltos no sudário da saudade, como Agdo Oliveira Santos, Antonio Messias de Jesus, João Bosco Siqueira, José Benedito Góis de Oliveira, José Fernando de Araújo Mendonça, José Luciano de Siqueira, José Luiz da Conceição, José Milton Machado, Josias da Silva Nunes e Tarcisio Menezes dos Santos.

É como membro desta geração, dos anos quarenta e cinqüenta do século passado, que recebo a homenagem que a Justiça Federal sergipana me presta.

Em nome deste rol imenso de amigos me rendo e me inclino, em agradecimento, pela honra de poder ver meu nome à frente deste Fórum, na certeza de que, caso a homenagem persista, mais tarde, muito mais tarde, quando não passar de um nome a mais entre as sepulturas do Cemitério das Almas de Itabaiana, alguém, ao vê-lo aqui grafado, perguntando quem fui eu para merecer tal homenagem, espero que respondam, não que fui um magistrado que sempre procurou ser diligente nas decisões que tinha a tomar, mas que foi, antes e acima de tudo, um itabaianense que amou Itabaiana.

Muito obrigado.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


busca
autores

Autores

biblioteca

Biblioteca

Entrelaços do Coração é uma revista online e sem fins lucrativos compartilhada por diversos autores. Neste espaço, você encontra várias vertentes da literatura: atualidades, crônicas, reportagens, contos, poesias, fotografias, entre outros. Não há linha específica a ser seguida, pois acreditamos que a unidade do SER é buscada na multiplicidade de ideias, sonhos, projetos. Cada autor assume inteira responsabilidade sobre o conteúdo, não representando necessariamente a linha editorial dos demais.
Poemas Silenciosos

Flickr do (Entre)laços
[slickr-flickr type=slideshow]