“ARTISTA SACERDOTAL DA PALAVRA”
O célebre D. Helder Câmara (cujo centenário de nascimento está sendo celebrado), dentre as suas máximas, dizia que “ a arte de envelhecer é seguir o caminho dos frutos”, isto é, ninguém gosta de fruta verde. É preciso, envelhecer com sabor, com gosto,sendo apreciado por todos. Parece que essa comparação se aplica diretamente ao Pe. Sadoc, que no próximo dia 20 de março completa seus vigorosos 93 anos.
Ele continua lúcido, forte, com saúde. Às vezes, diante de qualquer incômodo nas articulações, ele diz com humor que seus ossos “já podem contar história e já têm uma certa quilometragem”.
É assim que ele enfrenta a vida: sempre de bom humor e disponível para servir. Já presenciei, como fruto dessa disponibilidade, algum “engarrafamento” de atividades, como por exemplo, duas missas e mais um outro compromisso simultâneo. Mas é essa a arte de viver dele: está sempre à disposição dos outros, pode-se até dizer que ele não sabe dizer “não” às inúmeras solicitações de que é cercado.
Prof. Edivaldo Boaventura, no artigo que integra a coletânea do livro em homenagem aos 90 anos do homenageado (Pe. Sadoc, 90 anos, Pároco, Orador e Amigo), abre o coração exclamando: ”Ah! Como somos realmente privilegiados de poder fruir da palavra de um grande pregador.Raros são os oradores, como Sadoc, que conseguem processar o pensamento com lógica e concatenação ao expressá-lo com justeza. (…) Sadoc, artista sacerdotal da palavra, cria quando pronuncia” – daí o sub-título do artigo. E ainda enriquece o discurso comentando o estilo literário: “Aprecio particularmente as suas aliterações:’ E assim, ameaçados, muitos jovens, desordenadamente vivem, desordenadamente vivem’. Igualmente as paranomásias e as antíteses, a exemplo:’ É bem pouco o que vos trago, mas trago-vos tudo que tenho’, completa”.
Já como seminarista foi chamado, por diversas vezes, a pregar em festas e celebrações religiosas.Em 1944, como jovem padre ( sua ordenação foi em 1941), é convidado para a festa da Purificação na sua cidade.Lá profere um Sermão que se tornou um dos seus clássicos.” Mulier, quid fecisti ?” – é a pergunta do Criador a Eva no Paraíso, após a queda: ” Mulher, o que fizeste ?”
E começa mostrando a alegria de todos estarem reunidos na casa da Mãe. Mas não se esquece do título histórico que a cidade recebeu do Imperador Pedro II : ”Neste templo, a mais bela dentre tantas casas de Deus, na mais ‘leal’, dentre tantas leais cidades da Bahia, reúne-se o povo que mais acendrada e incondicionalmente ama a Santíssima Virgem da Purificação”.
E faz uma incursão na exegese do texto, mostrando as conseqüências da primeira desobediência :”Em o Paraíso que nunca deveria ter sido perdido, estabeleceu-se este diálogo, entre Deus e a mulher, o Senhor de tudo e a mulher sem nada.(…) Naquele instante, pareceram fragorosamente ruir os maravilhosos planos da Providência”. Prossegue a sua reflexão mostrando nos povos clássicos, Grécia e Roma, que a mulher parecia carregar o peso da maldição do Gênesis. “Fizeram a mulher vil e sem apreço, escravizada ao capricho do homem, no silêncio humilhante da subalternidade”. E volta, como um refrão, o ponto central do seu discurso : “Mulher, o que fizeste ?” Mas ele não fica apenas com essa pergunta. Ele mostra que o Deus Pai Criador não deixa a humanidade sozinha e abandonada aos seus caprichos. E numa mistura de poesia, com textos bíblicos, é anunciada a vinda de Cristo , para religar o que parecia perdido e para restituir à mulher a dignidade na qual ela foi criada : “Eis senão quando, noite a meio, uma criança nasce, iluminando-se a pobreza do seu presépio com as intensíssimas luzes duma nova estrela. Com um Deus de mulher nascido, começa a verdadeira história da mulher. (…) Restaura-se a dignidade feminina. Enche-se a história da benéfica presença ativa da mulher”. E relembrando o Menino Jesus perdido no Templo, ele mostra a inversão de papéis. No Gênesis, Deus pergunta à mulher : “O que fizeste ?”. Mas agora, é a Mulher-Mãe quem pergunta a Deus, que misteriosamente é seu filho :”Filho, por que assim procedeste?”.
O dia 20 de março é sempre intenso, para o festejado e seus amigos. Pela manhã, às oito horas, haverá a Missa na Vitória, à qual acorrerão muitos amigos. Para o almoço, o fiel amigo Claudelino Miranda, da Amanda, e que é assessor especial e Chefe de Gabinete do Vice-Prefeito Dr. Edvaldo Brito, preparou um almoço festivo no Hotel da Bahia.
O que podemos desejar para o Pe. Sadoc? “Ad multos annos” , que viva muitos anos!
(*) Professor Adjunto de Antropologia da UNEB, da Faculdade 2 de Julho e da Cairu. Membro do IGHB ,do Instituto Genealógico e da Academia Mater Salvatoris