Jamais espere um convite com a convicção de que “ele” virá na hora certa, a maioria sempre vem…em hora errada! Aí, nada se acerta.
– Quer assistir um filme comigo?
Katharina ouviu incrédula. O convite chegava como quem chega surpresa, enunciação X enunciado entraram exigindo resposta imediata. Ela decodificou como quem se conecta a um programa há muito esperado. Presa ao visor do computador, respondeu:
– Quero! – “Clic”. Murmúrio solitário, frase solta, sonho, virtual x real. Ele o inatingível, ali a sua frente convidando-a para assistir um filme. Com a velocidade acima de todos MHZ já alcançados na EraVirtualismo veio o desastre:
– Onde? – perguntou Katharina.
– Como onde!? – respondeu perguntando o Ilustríssimo já na retaguarda – no cinema é claro! Onde você pensou que fosse? Em minha casa? Heheh – Perguntou respondendo o mesmíssimo. Ironia, sarcástica leveza do ser, alcançá-lo? …Difícil!…Seria como perseguir um sonho do passado: “Encontrar um amigo na escuridão do tempo, com uma pequena lanterna chamada vida instante…” impossível. Hoje provavelmente seria mais fácil, lembrou-se da Internet, presença cálida, distância.
Se o momento fosse computadorizado ela o teria resetado e começado tudo de novo. Não ela não podia!!! Em sua cadeira giratória atrás do visor, retirou a mão do mouse entrelaçando os dedos em posição de reza, segurou o queixo, pensou: “Não acreditooooo, estraguei tudo”. Cruzou as pernas, procurou respostas ainda com os dedos cruzados segurando o queixo. É claro queria sair da posição tanto quanto do gesto, seu posicionamento simbolizava um monumento “reflexionário”, porém somente refletia. Ela na “versão” presença, sentia a verdadeira dimensão do encontro com a fuga e o medo, tentou consertar:
– Bom! Quero dizer…Acontece que há tempos não vou ao cinema, achei que…deixa pra lá, hoje não daria mesmo, tenho aula…prova, não poderia ir mesmo que quisesse.
Mãos nervosas, procuravam programas perdidos, documentos, abriu arquivos, fechou, clicou e clicou…coração há muito não “quicava” forte, esperanças perdidas, o Ilustríssimo ali a sua frente. Repensou…já não tão rápido: “Convite: quer assistir um filme comigo?…Quero!….Onde? Como onde? (…) Em minha casa?!”. Uma pergunta, muitas respostas-perguntas e perguntas-respostas…Quantas desproporcionalidades deveriam ser jogadas na lixeira do tempo. Distância.
Caso a resposta, a única resposta do contexto fosse outra: “Vou pensar, quem sabe…outro dia, hoje não posso…” Uma simples informação contrária ao sentimento de espera, talvez fosse a solução, nem sempre um “quero” é querido. A emoção do outro lado, poderia estar ainda na preparação da espera. A surpresa do “quero” real de encontro com um “talvez” esperado pelo virtual, surtiu por demais efeito especial imediato. Mentes programadas para irem além? Ela tanto esperou pela pergunta que em um único “clic” dimensionou-se a ver o filme: “refrigerantes, pipocas, calor humano, voz macia. “Quero!” “Clic”…Era tudo o que mais queria.
Calma Katharina, seu querer tem limites percebeu? Uma questão nem sempre pode ser formulada para ser uma questão, às vezes ao acaso encontra-se no virtual e o querer medo real afasta o proponente do proposto, a ironia do depois interage como escudo de quem sabe sofrer decepções sem demonstrar covardia. Pense…Tente:
“Como onde!? No cinema é claro! Onde você pensou que fosse? em minha casa?!” Sim!…Pensei em sua casa! Por que é proibido pensar além da questão?…”
Vixe!!! Já imaginou? Você Katharina, com a coragem de responder o sentido!? O pensado!? Não?…Ironia combate-se com ironia, real com real, virtual com virtual. Voltemos à ironia, neste caso sinônimo de ingênua sinceridade.
“Sim!…Pensei em sua casa, nós dois deitados no chão, assistindo um filme, comendo pipocas e bebendo refrigerantes”.
Ultra Romântico, pós-moderno, futurismo, tridimensional? “Não!…Não!…Nada virtual, muita intromissão, ilusão interdimensão. POESIA SIM!!! DEMAGOGIA NÃO”.
Katharina não disse o que pensou, seu pensamento revestiu-se de desilusão, o “comer pipocas com refrigerantes” explica: ela visualizou apenas uma dimensão do querer, “deitados no chão”: disfarce enigmático, faltava o surrealismo: “Ah! esse ilustríssimo virtual, porco chauvinista!!! Hospedeiro real de acatalepsia”, volta Katharina…”Clic”.
– Prova hoje? Tudo bem, qualquer dia destes eu te ligo ai a gente combina. – Disse o tal pós-caos ao afastar-se. Virou-se de costas e foi-se simplesmente embora.
Ela nada disse, não valia a pena, descruzando os dedos e as pernas pensou: “Certo! Te ligo outra hora…Ele não vai ligar!” – Kath…e a experiência? Inter-integração? Esquece? Reset? – “Se ele não ligar, vou ao cinema sozinha” – Ótimo provar o quê? Para quem? – “Não preciso do outro, nesta minha dimensão não existe o estar só. Só sou suficientemente Ser…Virtual, Real…Escambal! Telepatia, Ironia, Autonomia!!!Vou ao cinema sozinha”.
E Katharina foi…enfrentou fila…comprou pipocas…refrigerantes…sentou-se bem a frente da tela interdimensional… sétima maravilha mundial…pré da oitava ainda no virtual e provavelmente universal…sofreu…chorou…xingou…riu… amou…sentiu-se SER. Visualizou na tela, Seres e seres em plena fase de convites, pensou: “Eu me basto!”
Na tela pai filho, raro encontro…
– Oi filho, o que vc está lendo?
– Uma “história” em 3-D.
– História em 3-D…Brincadeira! Isso já existe?
– Claro velho, quer ler?
– D’ai!…Não vejo nada…letra nenhuma…só uns pequenos desenhos de palhaços e pessoas num circo em um círculo bem grande.
– Quer que eu leia pra vc? Pai relaxa…deita aqui.
– Ah! Então leia, essa eu quero ouvir.
– Preste atenção! Para se ler em 3-D, é preciso concentração, fixa-se os olhos no centro da página, às vezes é necessário uma certa aproximação, ou até mesmo um certo afastamento do objeto, aí as imagens vão surgindo…surgindo….
Era uma vez, um médico cirurgião, psicólogo, analista, anestesista, pedagogo letrado, enfermeiro safado e depravado – Ah! estes cursos on-line.- O qual de circo um dia também foi artista…seguro, ingênuo e vulnerável. Em três dimensões tinha três pacientes…impacientes. Todos os dias na mesma hora marcada começava a terapia, na sala de cirurgia, na drogaria chamada Utopia, ou na loja da esquina A Poesia.
O Primeiro: Halterofilista, Anarquista, Marxista, Socialista, o tal que de avião um dia também foi mecânico – Huuurruumm! sente só o cheiro de graxa – Conseguia levantar a traseira de um avião com as mãos, parecia um touro bravo, nervoso, invocado e mal encarado.
A Segunda – Ai! Ai! Que som!!! – Violinista, apesar de amar a música não tocava no tom. Porém tentava.
A Terceira – Uauuuu!!! – Enfermeira, costureira, arrumadeira, defensora dos fracos e comprimidos, ou seria dos frascos e oprimidos? Era confusa, sincera e fera. Pensava e como pensava! Analisava, também…telepata, lia, relia e sofria com os objetos, imagens e pensamentos que de todos os lados surgiam. Pacata e Pacifista.
O médico cirurgião, psicólogo, analista, anestesista, pedagogo letrado, enfermeiro safado e depravado, o qual de circo um dia também foi artista…seguro, ingênuo e vulnerável. Um certo dia na mesma hora marcada, quando começava a terapia, resolveu operar! Inseriu o bisturi na Violinista que sofria a hipermetropia e a miopia. O referido médico, iniciou a cirurgia num tom errado e foi captado pelo pavilhão auditivo, as vibrações repercutiram nos tímpanos dos presentes, impulsos nervosos enviados ao cérebro, como sons de violino desafinado, acabou com a Segunda que inerte ficou.
O Mal Encarado se esquentou e explodiu: “NÃO É FÁCIL!!!” Sentiu um desejo enorme de levantar a traseira de um avião com as mãos, contudo confidenciou à Confusa: – Um soco direto no olho direito, deste que de circo um dia também foi artista, coooomo me acalmaria! – Pronto estava ativado o seu sistema nervoso periférico a ponto de ocorrer um potencial de ação, quando o médico cirurgião, psicólogo, analista, sem anestesia resolveu operar o Halterofilista. Cirurgia difícil!…O Infeliz gritou: – Cadê o avião?…- Resmungou, resmungou…conteve-se.
O Pedagogo Letrado, escondeu-se atrás do livro de bisturi seu escudo preferido, e enfrentou o Anarquista. O Marxista, Socialista sem transmitir os impulsos sensitivos ao cérebro, cortou a ativação motora do seu organismo e num impulso de tamanha lucidez deixou a terapia, e foi queixar-se ao diretor geral daquela estrebaria.
A Enfermeira seguiu-o. Não era mais Confusa, apenas Defensora dos fracos e oprimidos. Pensou e pensou sinceramente: “O Halterofilista Anarquista, o tal que de avião um dia também foi mecânico, voltará e com apenas uma das mãos acabará com o médico cirurgião…seguro, ingênuo e mais vulnerável que uma vespa”.
A Costureira, Arrumadeira, Telepata, lia, relia, ouvia e sofria com os pensamentos que de todos os lados surgiam, não sofria a acatalepsia, enxergava em todas as dimensões e direções. O universo real, o não virtual, quando transcende revela dimensões infinitas, de Seres e Seres. Naquele momento o seu objetivo: “Defender alguém que na escola da vida faltou a muitas aulas, alguém que de letra tira a prática, da qual só tem teorias”.
Cada Ser humano tem seu campo, sua óptica, e deve ser visualizado não apenas como um quadro estático ou surrealista, com milhões e milhões de pontos marcados ou programados, mas sim com todos os recursos individuais, reais, virtuais e transcendentais, que compreendem todo um universo de tempo, espaço, potência e faculdade.
A Terceira era malvista pelo médico, o qual de circo um dia também foi artista. A Pacata repensou sinceramente: Seria interessante vê-lo amassado, recebendo a paga pelos erros cometidos”. Mas contudo, entretanto e todavia o pedagogo usava ainda monitores quadrados, não conseguiria jamais circular seus pensamentos ou focalizar outras dimensões. Não enxergava nem ao menos dentro de si mesmo.
A Telepata que um dia também foi pacata, transferiu para si todo o clima da terapia, assumiu o ser pacifista e futurista, aprendeu a ser e a dominar seu ser anarquista – Ããnnrraahamm! Pai lembra-se da “Megera Domada” de Shakespeare?.
O Médico cirurgião, psicólogo, analista, anestesista, pedagogo letrado, enfermeiro safado e depravado, o qual de circo um dia também foi artista…seguro, ingênuo e mais vulnerável que uma vespa, saiu da terapia sem nenhum aranhão, livrou-se do Marxista, Socialista que se esqueceu do avião e não levantou sequer a mão. O safado e depravado, formou-se ainda em advogado, promotor, juiz e ladrão. Condenou aquela criatura sincera e fera, simplesmente por ter sido bem intencionada, a passar a vida toda condenada a pedir-lhe perdão.
Seguiu feliz o seguro, ingênuo e vulnerável doutor…Que pena! Tanta sabedoria e portador de acatalepsia.
– Fim! Pai gostou?
– O quê! Vc leu tudo isso ai nessa folha?
– Sim! E, é fácil ler em 3-D quando a gente conhece a “manha”, aquela velha imagem chamada psicologia humana.
– Lê de novo, não entendi muito bem, ou então me ensina a “manha”
– Claro pai, podemos recomeçar agora mesmo. Ah! Por acaso vc sabe o que significa acatalepsia?
Voltam as luzes, final de mais uma história dentro da história, inserida em sua própria história. Katharina pensava nas pessoas que ainda sofriam de acatalepsia.
Saiu do cinema pelo outro lado da tela, na rua observava o horizonte. A Era daqueles que sempre serão eternos despontava trazendo uma nova etapa. Preparada pelas belíssimas épocas passadas. Histórias e mais histórias inseridas na própria história. Ser parte delas, fragmento de um todo. Isso importa.
Katharina em direção a sua casa, sozinha pensava: “Ser, buscar na essência do passado-virtual, conhecer o famoso presente-real. E quanto a EraVirtualismo? Hoje simplesmente e humildemente temos que ser o que somos…Ser o que Sou…Para Sou o que Ser”. Seu pensamento voava às épocas passadas, convites, tecnologia, acatalepsia. Pensava na Poesia, um dos possíveis antídotos contra o mal deste e de muitos outros séculos. Na madrugada, aurora de um novo dia, Katharina sem se importar com o tempo, sorri ingenuamente ao deparar-se com um cartaz enorme, outro convite, propaganda de uma aeronave último tipo:
“Ei!… Vc ai…. Quer viajar comigo?…”
Bauru/SP
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