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O Natal nos recorda os presépios. Muitas vezes, quando crianças nós os organizávamos com muita expectativa. Hoje ainda há famílias que mantêm essa tradição, apresentando presépios em grandes dimensões, como D. Nalvinha na cidade de Maragojipe. E tem havido exposições de grande porte onde essa tradição tão natalina vem sendo conservada. O Projeto A Grande Arca teve sua primeira mostra no Goethe Institut de Salvador, em 2002 no Mercado Cultural. A segunda mostra aconteceu na Galeria Canizãres na Escola de Belas Artes da UFBA como projeto conclusivo do Mestrado em Artes Visuais. Em 2007 foi feita uma apresentação que deu continuidade a esses Projetos. Que eles se multipliquem, pois essas apresentações não significam apenas um olhar para o passado, mas, além de serem um apelo a valores religiosos, são uma manifestação da religiosidade popular, muitas vezes permeada de histórias-estórias pessoais com referências familiares a partir de contos e narrações populares. Edgard Oliva fala “na manutenção dessas estruturas culturais, da memória cultural desse país que, se ainda resta uma esperança de salvar-se, está, seguramente, na memória e persistência daqueles que não se deixaram contaminar pelo mal do consumismo e dos modismos que a atual indústria do consumo impõe”.

Dos símbolos do Natal, o mais justo, mais autêntico e digno de comemoração é o presépio. O presépio é uma comemoração à data do nascimento de Cristo, e tomou essa denominação do fato de haver o acontecimento bíblico ocorrido em uma manjedoura de animais.

O significado da gruta de Belém foi bem compreendida por Francisco. No ano de 1223, numa floresta de Rieti, na Itália, S. Francisco de Assis encontrou um estábulo abandonado. Logo colocou lá uma imagem do Menino Jesus, alguns animais vivos, compondo assim um dos mais belos presépios da história – aliás, o primeiro. Convidou para a Missa de Natal seus irmãos franciscanos e todos os habitantes do vale. Podemos imaginar a magia daquela celebração acompanhada de belas melodias que se espalhavam pela floresta, rompendo as nuvens e cantando o “Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade”.
A partir daí, o costume dos presépios se espalhou pelo mundo cristão. Depois dos franciscanos, os dominicanos e mais tarde os jesuítas, foram os que mais difundiram a tradição cristã dos presépios. Associado ao sentido da devoção religiosa, gerou-se um produto ímpar que foi o incentivo à habilidade manual e da criatividade dos diversos povos.

Desde o início do século XIII as festas de natal tiveram lugar nas igrejas, saindo delas e irradiando-se pela comunidade. Os cantos puramente religiosos e litúrgicos foram acrescidos de cantos populares, havendo uma tentativa de manter o religioso, mesmo que apresentassem características profanas, conservando a beleza artística e mística do Natal. Portanto, vêm dessa época os autos e cheganças da noite de Natal, onde trovadores seguiam as cerimônias solenes indo até às lapinhas, em que personagens da comunidade reviviam a Auto de Natal. No Brasil, temos muitas tradições natalinas nas quais vemos a influência de Gil Vicente com os Autos Pastoris representados na Corte Portuguesa, como tantos outros elementos que vieram do “reino”, como a pimenta, a cebola e até o cravo.

Belíssimos presépios estão espalhados pelo mundo inteiro. É notória, por sua beleza e impressionante realidade, um presépio feito em Nápoles no século XIII. O Museu de Munique contém a maior coleção de presépios do mundo. Em 1987, no anfiteatro de Verona, na Itália, foi organizada uma reprodução da história do presépio no mundo. Da América Latina, estiveram expostos exemplares do Peru, Argentina, México e Venezuela. O público que visitou aquela exposição, elegeu como o mais bonito, um precioso exemplar de 1700, pertencente ao Museu Nacional de Praga.

É certo que o presépio suscita em nós uma atração quase irresistível. Mas a nossa contemplação não quer ficar somente no nível externo. O presépio tem um apelo de atualidade. Há muitos meninos que estão nascendo e vivendo nas manjedouras das nossas ruas e praças e que precisam do nosso “ouro, incenso e mirra”.

O Natal tem a significação básica de Deus na História. E queremos recuperar o sentido bíblico desse evento histórico. A idéia da pessoa como templo – “tempos vivos que vós sois”, diz S. Paulo – onde mora Deus está sendo esquecida pela humanidade que não se convenceu ainda que o presépio de Deus é o coração do homem e da mulher.

No modelo competitivo em que vive a humanidade há milênios, é o mais forte que dita a regra. O Natal, inaugurando uma outra lógica, mostra que na nova Lei, a do Amor, quem diz a última palavra é o mais fraco.
Para combater o caráter eminentemente comercial que caracteriza esse tempo natalino, somos convocados a abrir o coração para deixar que o Deus-Menino possa nascer em nós.

O grande presépio montado na Praça da Sé, com seus belos corais, reúne a todos numa contemplação de um natal encenado mas que é, ao mesmo tempo, projeção de um desejo de que sua mensagem se realize efetivamente no nosso meio. O Natal é a celebração da entrada de Deus-Menino na nossa História para fazer dela a Sua História.È a festa do Deus- Conosco na qual a pessoa humana não está mais sozinha.

(*) Sebastião Heber. Professor Adjunto de Antropologia da UNEB, da Faculdade 2 de Julho e da Cairu. Membro do IGHB ,do Instituto Genealógico e da Academia Mater Salvatoris.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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