( teóloga, professora e decana do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio)

A palavra “advento” quer dizer “que está por vir”, ou que está “ad-vindo”, chegando, deixando-se pressentir e fazendo-se esperar com amor e alegria. O tempo do Advento – fazendo jus ao nome – é para toda a Igreja a vivência do mistério de espera e preparação da vinda de Cristo. Neste tempo, celebramos nas primeiras semanas a espiritualidade de espera da vinda do Senhor que se aproxima. Decorrem daí todas as exortações à vigilância e a atitude alerta em direção Àquele que vem marcando os textos da liturgia. Nas semanas mais próximas ao fim do Advento e à chegada da festa natalina propriamente dita, vive-se então a preparação mais imediata para as solenidades de celebração do nascimento do Salvador.

O Advento marca o início do Ano Litúrgico. Celebra a vinda definitiva do Senhor em sua Encarnação que se faz sensível entre nós no Natal. É um tempo de quatro semanas durante as quais a Igreja vive em vigilante, piedosa e esperançosa expectativa. Pela penitência e a oração, a comunidade eclesial aprende a viver a expectativa vigilante, preparando a vida e o coração para acolher Aquele que vem e cujo mistério não se deixa desvendar pela razão nem pela pressa pós-moderna da sociedade capitalista e da cultura de sensações seduzidas.

Este Advento acontece em meio a uma grande crise econômico-financeira, que deixa os países afluentes e ricos cheios de pavor ante a perspectiva de perderem seu estilo de vida confortável e luxuoso. Enquanto isso, os países pobres se vêem ameaçados de que pese sobre eles – como sempre acontece – as conseqüências da crise e do terror gerado entre os ricos, que farão de tudo para salvar seu capital e sua riqueza.

As medidas já vão sendo tomadas e milhões e mesmo bilhões são derramados nos cofres das grandes potências, a fim de assegurar aos que já têm a certeza de que não correm o risco de baixar seu padrão de consumo. É triste constatá-lo. Parece que não se aprendeu grande coisa com a crise. O Natal deste ano deveria, pelo menos para nós, que acreditamos em Jesus Cristo e o confessamos como Senhor, Cristo e Filho de Deus, ter uma marca diferente: a da austeridade.

Em lugar do consumo, a partilha com os mais pobres. Em lugar de abundância de comida, sobriedade para que outros possam ter uma vez por ano uma refeição melhor e mais abundante. Em lugar de infinitos embrulhos e presentes, a presença carinhosa que se faz próxima dos tristes, dos sozinhos, dos que não têm motivo nenhum para comemorar e a cujos ouvidos as canções de Natal só trazem tristes recordações de seres queridos perdidos e distantes. Em lugar do frenesi, da louca gincana pelas lojas, das horas passadas nos shoppings, a espera: fiel, vigilante, ardente.

Simone Weil, filósofa francesa e mística ardente cujo centenário comemoramos em 2009, nos ensina que a atitude espiritual fundamental do cristão é a espera. Com a condição, evidentemente, de entendê-la não em sentido passivo, mas como a ardente “vigilância do servidor aberto e voltado para o retorno do mestre”, como o estado provisório de uma busca que prefere ao prazer da caça a escuta da verdade em íntima comunhão. A experiência interior a que o tempo do Advento convida e convoca deveria ter essa ênfase: da intensidade e da não completude. É um diálogo consigo mesmo, com os outros, com Deus, até os níveis mais profundos e mais viscerais da existência, deixando-se interpelar pelo Mistério que, não contente em fazer-se carne, se faz criança, indefesa, frágil e vulnerável.

É ainda Simone Weil que nos recalca a importância da virtude da atenção. Suspender o pensamento, deixá-lo disponível ao mistério contemplado, manter em si mesmo a razão ativa, mas suspensa, em espera, nada buscando, mas pronta a receber em sua verdade nua o objeto que nela vai penetrar.

Que o Advento de 2009 nos introduza no aprendizado de maior austeridade. E nos torne menos indignos do Senhor que vem com a singeleza de um Menino envolto em faixas e deitado em uma manjedoura.

(*) Autora de “Simone Weil – A força e a fraqueza do amor” (Ed. Rocco).

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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