Padre Beto 27 de dezembro de 2008

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Quando estoura a Primeira Guerra Mundial, no verão de 1914, milhões de homens são pegos de surpresa e levados à fronte do conflito. Depois de alguns meses de batalha, exatamente em dezembro, véspera de Natal, algo mágico acontece. Na noite em que se recorda o nascimento de Jesus Cristo, os soldados saem de suas trincheiras e deixam para trás seus rifles para se confraternizar com o inimigo. A aproximação torna-se então um ato subversivo. Os homens, desde os soldados até os comandantes, começam a se conhecer pessoalmente deixando de ser o inimigo anônimo. Deste simples contato pessoal todos são reconhecidos como seres humanos que possuem vida, sentimentos, esperanças e desejam simplesmente voltar para suas famílias. Assim, o espírito do Natal transforma de maneira subversiva a relação entre escoceses, franceses e alemães. Esta é a verdadeira história da trégua de Natal declarada na Primeira Guerra Mundial que podemos meditar assistindo o excelente filme Feliz Natal, do diretor Christian Carion.

A festa do Natal é, para nós cristãos, um momento significativo no qual relembramos que Deus ama a todos igualmente, independentemente de cultura, religião, mentalidade ou prática de vida. O verbo se fez carne, ou seja, Deus se fez humano revelando assim que todo ser humano é sagrado. Apesar de toda euforia sobre a figura do “Papai Noel” celebrar o Natal significa, em primeiro lugar, a recordação de que Jesus Cristo esteve entre nós. Jesus Cristo é para todos aqueles que Nele acreditam um fantástico paradigma, ou seja, um modelo de vida que transforma radicalmente nosso comportamento e nossa perspectiva de futuro. Suas palavras e ações são impulsos de lucidez que nos indicam que o ser transcendente que chamamos de Deus não nos deu a vida para morrermos, mas sim para vivermos como filhos de Deus. Portanto, o Natal não é uma simples recordação da presença de Jesus entre nós, mas, ao mesmo tempo, a revitalização em nós dos valores pregados e vividos por Ele. Esses valores se resumem no respeito profundo pela vida e principalmente pela vida humana. Celebrar verdadeiramente o Natal significa reconhecermos que a vida é sagrada e nos respeitarmos mutuamente como filhos de Deus. Justamente neste reconhecimento do sagrado no humano está o segredo da vida. “Nós sabemos que passamos da morte para a vida porque amamos os irmãos” (1 Jo 3, 14). Este amor bíblico não significa um amor cego e ingênuo, mas um sentimento lúcido que nasce do desejo de vida e principalmente da consciência de buscarmos compreender as pessoas que nos circundam e as situações que nos envolvem. O amor que nos leva à vida é acompanhado pela razão crítica. Um amor que nos faz compreender racionalmente que todo o ser humano, seja ele simpático ou não, merece respeito e possui o direito de ser feliz. Quando nos conscientizamos de que o respeito ao outro é fonte de felicidade para todos, algo mágico acontece em nossas vidas, ou seja, fazemos uma experiência concreta de mudança, de transformação da nossa realidade, enfim, vivemos o Natal. Volto a repetir, o Natal não é somente a recordação da existência de Jesus Cristo entre nós, mas principalmente a incorporação de seus valores universais em nossa vida. O Natal realmente acontece a partir do momento que analiso minha vida atual e procuro fazer uma autocrítica em busca da libertação de meus medos e de minhas insensibilidades. O Natal acontece quando me jogo nas mãos do Deus da Vida e transformo minha existência em algo sensível e humano. É Natal quando minha razão humana compreende que não devemos admitir injustiças, que podemos construir uma sociedade mais humana e principalmente que todo o ser humano é filho de Deus. Ao compreendermos o sentido real da celebração do Natal, tudo que utilizamos nesta data torna-se significativo. Damos presentes porque desejamos demonstrar a importância do outro. Em outras palavras, não trocamos presentes porque é Natal, mas presenteamos alguém para que seja Natal. Ceamos juntos não porque a tradição assim exige, mas porque comer e festejar juntos é sinal de amizade entre parentes e amigos. Decoramos com luzes nossos ambientes porque desejamos ser luz neste mundo marcado por desrespeito e violência. Enfim, todos os símbolos do Natal devem ser formas de expressão de algo que realmente acontece em nossa vida. Se assim não é feito, o Natal torna-se ilusão, vazio, hipócrita e um gasto desnecessário. Para muitos o Natal poderá ser mais uma oportunidade de comer e beber, mas para quem compreende o espírito do Natal esta data é uma oportunidade de verdadeira transformação de vida.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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