Padre Beto 15 de novembro de 2008

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José resolveu comprar uma calça. Depois de procurar em várias lojas finalmente achou o modelo de calça que desejava. Havia, porém, um pequeno problema: a loja não tinha seu número. Mesmo sendo as pernas da calça três centímetros mais longas que as suas, o homem decidiu comprá-la. José não sabia costurar, mas tinha a certeza que uma das três mulheres de sua família resolveria o problema. Ao chegar em casa, José perguntou a sua esposa se ela poderia encurtar a calça. A mulher nem deu ouvidos ao marido e continuou a assistir seu programa favorito de televisão. Também com sua sogra o homem não teve sorte. Ela estava concentrada em sua leitura e não deu a mínima ao pedido do genro. Finalmente, José encontrou sua filha, mas esta não tinha tempo, pois estava saindo para encontrar o namorado. O homem ficou bastante chateado pela falta de interesse de sua família. José deixou, então, a calça no cabide, saiu para dar um passeio e refrescar a cabeça. Alguns minutos depois sua esposa mudou de idéia e tirou os três centímetros da calça. Depois de algumas horas sua sogra se arrependeu de não dar a devida atenção ao genro, pegou a calça e cortou fora mais três centímetros. Às onze horas da noite chegou sua filha em casa e viu a calça no cabide lembrando do pedido de seu pai. A filha cortou mais três centímetros e pensou: “Com certeza, o paizão, vai ficar super feliz amanhã de manha!” Sendo demasiadamente utilizada por alguns e completamente esquecida por outros, flutuam em torno da expressão “pecado” várias concepções falsas. Em primeiro lugar relaciona-se pecado à moral. Cometer um pecado significaria desrespeitar alguma regra de moral. Porém, nem toda infração da moral constitui-se em um pecado, como também existem normas morais que levam pessoas a pecar. O chamado “imoral”, nem sempre é um pecador. Outra concepção falsa sobre o pecado é sua relação automática com a sexualidade. Sem dúvida alguma, a sexualidade pode ser vivida em um estado de pecado, como qualquer outra dimensão da vida: trabalho, alimentação ou até mesmo a religião. Mas, sexualidade em si é um dom divino que deve nos levar através do prazer a uma harmonia com nosso ser, com os outros e com Deus. O pecado passou também a ser sinônimo de atos errados. O erro, porém, faz parte da vida humana e quase sempre ele está na periferia do pecado e não se constitui no pecado em si. “O ser humano não pode deixar de cometer erros; é com os erros, que os homens de bom senso aprendem a sabedoria para o futuro” (Plutarco). Graças à sua relação com o erro, costumou-se fazer a ligação direta entre pecado e culpa, como também pecado e punição. Porém, nem sempre um pecado merece um sentimento de culpa e na maioria das vezes não pode ser tratado com uma punição. Por fim, quando falamos em pecado quase que necessariamente construímos a imagem de um Deus que nos controla e nos pune, sendo o extremo da punição o próprio inferno.

Em primeiro lugar é necessário compreender que o pecado não é simplesmente um ato errado que cometemos, mas sim uma situação na qual nos encontramos. Nesta situação somos levados a cometer atos errados ou a deixar de fazer alguma coisa (omissão). Eu me encontro em um estado de pecado quando vivo em desarmonia comigo mesmo, com os outros ou com meu meio ambiente. Um estado de pecado é gerado quando deixo de me amar e, portanto, passo a não mais me interessar pela vida. A partir daí, começo a cometer atos de destruição à minha pessoa: deixo de cuidar de minha saúde, permito que outras pessoas me explorem, não coloco meus dons em desenvolvimento, etc. O estado de pecado surge também quando deixo de amar pessoas que me circundam, me desinteresso por elas. Deste estado aparecem os atos egoístas, inimizades, ofensas, etc. Por fim, uma situação de pecado tem sua origem no desinteresse pelo universo onde vivo, o que gera atos que o prejudicam: estruturas sociais injustas, desrespeito ao outro graças à concorrência econômica, depredação do meio ambiente. Estes estados de pecado nos afastam automaticamente do Ser que nos deu a vida e que deseja que tenhamos vida e vida em abundância. Justamente, ao lugar afastado de Deus damos o nome de “inferno”. Portanto, o estado de pecado gera o inferno, não no sentido de punição, mas sim como sua conseqüência natural. Ao viver uma relação de desamor comigo mesmo, com aquelas pessoas que me circundam e com o meu meio ambiente acabo me distanciando Daquele que me ofereceu o dom da vida. No caso do pecado é inconveniente falar em punição, mas sim no resgate do sentido da vida. Automaticamente ao estarmos em uma situação de pecado, criamos um pequeno inferno à nossa volta: infelicidade, inimizade, ódio, etc. Diante dos sintomas, é necessário questionar sobre suas origens e caminhar em busca de uma melhor qualidade de vida. “Elimine a causa e o efeito cessa” (Miguel de Cervantes).

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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