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Você certamente já ouviu a expressão “conversa de bêbado”. Afinal de contas, o que diachos viria a ser uma conversa de bêbado? Dizem que poderia ser qualquer gênero de conversa, partindo da premissa em que os interlocutores estejam embriagados, a ponto de ninguém poder acender um fósforo por perto. Ou, simplesmente, qualquer diálogo sem “pé nem cabeça”.

Seria difícil pedir a um bêbado a definição sobre sua própria conversa. Até mesmo porque bêbado não é bêbado: ele bebe socialmente, como todo mundo. Talvez seja essa a causa que faça os avinhados socializarem melhor do que quem não bebe. Em minhas momentâneas passagens sóbrias, passei a acreditar que o bêbado integra uma das facções menos anti-sociais existentes. Ou mais socializáveis, como queira.

Dizem que bêbado quando está bêbado, nem parece bêbado. Parece fantoche. Tenta falar mais baixo para não espantar, tenta andar sem titubear, tenta não dormir, tenta manter concatenadas as idéias, tenta não revirar os olhos, tenta manter o passo, ou tenta ficar calado para não falar besteira – só não deixa o copo muito longe da garrafa para não pagar o mico de tentar virá-lo estando vazio.

Dizem que quando tenta falar mais baixo, todos notam e às vezes ninguém ouve o que ele tem a dizer. A evidência do pinguço torna-se clara. Imaginem todos bebendo, em uma mesa de bar, falando sobre assuntos diversos, de repente vem aquele gaiato falando mais baixo do que o normal. Se ficar calado, pior ainda. Todos falando, de repente um cara calado lá no canto. “Já está mamado!” – todos pensam.

Ouvi dizer que quando o caneiro se levanta para “puxar o carro”, tenta andar como uma pessoa sóbria, sem cambalear muito… e termina atraindo as atenções do bar. Parece um molambo. Para não perder o passo, puxa o joelho mais para cima do que o normal, assemelhando-se a um militar em marcha. Para não perder o rumo, tenta traçar uma linha reta no chão e não percebe que, a fim de seguir a dita cuja, é preciso ficar olhando atentamente para baixo, dando a impressão (só a impressão…) de que está tentando disfarçar um pouco o nível etílico no sangue.

Comentam por aí que o chumbeado também gosta de (tentar) manter as idéias concatenadas. Se temas como física nuclear avançada ou moléculas subatômicas envoltas no magma terrestre vierem à tona, ele já leu alguma coisa a respeito e consegue até mesmo explicar em “linguagem acessível para leigos”. Simultaneamente, tenta não mudar muito a posição de seus olhos: alguns abrem demais; outros tentam manter os olhos um pouco mais fechados, tudo para tentar parecer sóbrio. Deixa a impressão (só a impressão…) de que está tão mamado a ponto de dormir em pé.

Entretanto, mesmo à frente de pseudodisfarces, nenhum deles é pior do que ver o avinhado tentar conversar. Conversa de bêbado é lorota, dizem. É claro que o floreado não vai investir em uma conversa de bêbado, e sim em conversas sérias, concentradas, com caráter social. E é aí que a porca torce o rabo.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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