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Nesta semana em que a ONU nos convida a celebrar o “Dia do meio ambiente”, o Brasil tem mais a pedir perdão do que propriamente a festejar. As previsões de aumento das queimadas da Amazônia, como a rapidíssima transformação de grandes áreas do Cerrado em canaviais servem de alerta e alarme justo, principalmente depois que o Brasil viu a ministra Marina renunciar ao seu cargo no governo para continuar fiel a seus princípios e a sua missão de guardiã da floresta e defensora da vida, Esta missão, ela assumiu muito antes de ser convidada para ser ministra do governo Lula. O planeta Terra continuará contando com ela como dedicada madrinha e zelosa pastora da criação divina. Sua função de ministra permanente da integridade de todo o ambiente vem de sua fé cristã e desta missão nenhum presidente ou governo pode demiti-la ou impunemente desprestigiá-la.

Uma grande parte da sociedade civil brasileira votou em Lula não para que ele mantivesse os privilégios dos de sempre e sim para que, como presidente eleito por todos, colaborasse na transformação das estruturas injustas da sociedade brasileira. Neste Brasil do etanol, do PAC e do lucro milionário dos bancos, o povo assiste impotente este entusiasmo pelo “crescimento” capitalista e sabe que só poderá dizer alguma coisa daqui há dois anos, no momento das eleições. No que diz respeito ao cuidado com a Terra, a Água e todo ser vivo, muita gente se pergunta de que adianta o pequeno esforço de cada dia se os governos do mundo conduzem a economia em outra direção. Usar bicicleta no lugar do automóvel, poupar água, reciclar tudo o que se pode, optar pelo vegetarianismo… será que estas atitudes pessoais conseguem mudar alguma coisa na tragédia do aquecimento global e na mudança epocal que é a atual transformação climática? Afinal, as previsões que há dez anos pareciam exageradamente catastróficas se revelaram ingênuas e por demais otimistas. O aumento da temperatura, o desaparecimento das geleiras e as catástrofes climáticas estão ocorrendo muito mais cedo e com mais força do que os cientistas haviam previsto. Em um quadro como este, de que adianta plantar uma horta e consumir só produtos biológicos?

Vivemos em um país cuja cultura ainda é fascinada pela técnica, grande parte da juventude, mesmo de classe pobre, ainda se deixa hipnotizar pelas luzes dos shoppings e pelo encanto do consumo. Ainda temos pessoas que se lamentam de não poder comprar uma Ferrara e se endividam para aparecer com o carro do ano. É o correspondente pessoal ao ideal do governante que busca crescimento econômico e não hesita em desviar rios como o São Francisco, produzir energia com grandes hidrelétricas e transformar florestas em grandes plantações de soja ou de cana de açúcar para abastecer de etanol os automóveis de tio Sam.

Uma investigação feita com cientistas norte-americanos e resumida por Michael Pollan no New York Times revela que a crise provocada pela mudanças climáticas é fundamentalmente uma crise de estilo de vida. Ao contrario do que possa parecer, o grande problema não é outro que a soma de tantas pequenas decisões individuais, desde a que diz respeito aonde jogamos nosso lixo até o voto que damos às empresas quando compramos e consumimos seus produtos que destroem o planeta. Poucas pessoas sabem que 70% da economia de um pais é feita de nossos consumos cotidianos (Cf. Revista Internazionale, 745, 23/05/2008, p. 53).

Precisamos aperfeiçoar novos estilos de vida como instrumentos que as pessoas comuns tem nas próprias mãos para transformar a vida cotidiana e influir nas mudanças estruturais que precisam dos governos para serem efetivadas. Os novos estilos de vida partem do nível pessoal para passar ao comunitário até alcançar os vértices do sistema global. Trata-se de ações cotidianas, possíveis a todos e que põem em pratica o sonho de uma vida transformada a partir do cuidado com a própria saúde física e mental, com o futuro da humanidade e com toda a comunidade da vida espalhada sobre a terra.

Muitos cristãos e muitas pessoas de boa vontade, mesmo sem fé religiosa vivem como se acolhessem o convite de Paulo: “Não se conformem com a mentalidade deste mundo, mas se transformem pela renovação interior para discernir o projeto divino no mundo” (Rm 1)

*Monge beneditino, teólogo e escritor.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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