Malu Nogueira 24 de junho de 2008

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Não olho para o céu estrelado,
Olho para a fogueira do matuto roceiro que arde dentro de mim,
Crepitando a saudade que sofre meu coração ruim.
Bandeirolas coloridas enfeitam o oitão das casas luminosas
As calçadas estão tomadas de gente,
Vizinhos e amigos esquentam-se com meia dúzia de prosa fiada.
A sanfona de oito baixo começa o baião,
Com o ponteio da viola entre um verso e outro,
Ritmando os homens para dançarem a quadrilha que se organiza
Alguém traz uma bacia de ágata, contendo água, para fazer adivinhação.
Adivinha quem quer olhar?
Ninguém se habilita.
Quem não quer está aqui no ano que vem?
A fogueira foi feita de modo original:
Do lado dela, sem está fincada ao meio,
Foi colocada uma árvore, arrancada por completo da terra,
Enfeitaram-na com bandeiras e presentes,
Alguns vazios, outros cheios,
Tem sabonete Dorly, pasta dental, presilhas,
Enfeites para os cabelos, batom, pentes.
Os homens, com papéis e querosene acendem a fogueira.
O povo ao derredor olha fascinado a árvore,
Aguardando que ela penda de lado
E eles possam assim, agarrar os presentes.
O alarido é assustador!
Todos preparados para o grande momento.
As labaredas aumentam, a árvore pende,
O povo corre,
Começa o pega dos presentes.
Nada de cara sisuda ou triste,
A alegria festeja São João,
Que segurou a chuva, mandada por São José
E hoje, temos ouro, no milho amarelo das espigas,
Que pelas mãos das mulheres transforma-se na pamonha macia,
No cuscus com coco, na canjica e bolo dourado.
Comida farta para todos,
Que degustam com sabor.
A choupana do caboclo é palácio nessas bandas de cá,
Mundo escondido de tantos,
Onde o campo é perímetro percorrido sem paga,
Só o giro do suor derramado,
E as unhas sujas de terras
Denunciam a lida diária desse trabalhador incansável.
Nas ruas da bucólica cidade interiorana,
As casas estão mais coloridas,
Tem fogueira em cada porta,
O povo festeja com
Fogos, diabinhos e rojão
Mosquito e chuvinha
Bombinhas e ronqueiras,
Roupa de chita enfeitada para xotear a noite inteira
Calça rasgada com remendo, indumentária do matuto,
Alpargata de tiras de couro, para o xaxado dominar,
Chapéu de palha, com abas viradas,
Faca na bananeira,
A mocinha quer casar.
De momento, lá no fundo da rua
Surge um repente, que enche de lamento o peito fremente.
Na dor expressa ano após ano
Respira fundo no frio da noite,
Com as faíscas inundando o céu,
Na concorrência com os vaga-lumes,
E relata a história do balão perdido no céu iluminado,
Levando certamente a notícia do nascimento de outras
Festas juninas.

( 23/06/2008).

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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