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A tradição religiosa brasileira é majoritariamente católica, mesmo tendo a mesclagem da religiosidade indígena e dos afro descendentes. O catolicismo brasileiro é mais tradicional do que de conversão a um caminho novo de vida, proposto por Jesus Cristo. Grande parte desse catolicismo brasileiro, inclusive de Santarém e do Pará é baseado nas tradições passadas de avós, pais e parentes e de um ou outro missionário estrangeiro nas desobrigas irregulares. Estes vinham rápido, faziam uma catequese mínima e sacramentalizavam as “almas fiéis”.

Por conta dessa tradição a fé do povo foi sendo mantida baseada mais na catequese do que na evangelização. Daí a insegurança que perdura ainda hoje em muitos(as) católicos(as), quando se refere aos fundamentos de sua fé, de sua Igreja e de seus rituais. Jesus Cristo, primeiro evangelizou o povo, anunciou a Boa Nova e só depois, fez uma catequese com seus discípulos, já mais ou menos convertidos ao projeto do mestre. No Brasil a trajetória não foi a mesma de Jesus.

Então, por causa da fé tradicional da maioria da população brasileira, a Semana Santa é vivida ainda hoje, mais como ritual de lembranças, até emocionais (especialmente quando focalizam a paixão e morte de Jesus, e quando e onde se faz a procissão do Senhor morto), do que de memória de um acontecimento que tem a ver com a realidade humana de hoje.

Jesus morreu de modo tão cruel, não por causa de nossos pecados como a catequese antiga ensinava, mas por que amou todos os seres humanos, especialmente os humilhados e injustiçados. Como ele mesmo afirmou – “Não há maior amor do que dar a vida pelo irmão”. Ele poderia ter fugido do Monte das Oliveiras, escapado da morte, e até teve medo daquele sofrimento, mas não podia recuar, se seu testemunho de fidelidade ao Projeto de revelar a vontade do Pai para a felicidade de todos os seres humanos exigia falar e agir coerentemente. Daí ele gritar, Pai afasta de mim este cálice amargo…mas não se faça o que quero…

Quem passa a semana santa como ritual tradicional, faz lembrança do que ocorreu 1.962 anos atrás. Aí reza, faz penitência, faz jejum, via sacra, acompanha procissão do Senhor morto, se emociona com a narração ou filmagem da paixão de Cristo e pronto, tudo passa e a vida continua como dantes. Para esse tipo de católico a semana santa termina na sexta feira; já no sábado de aleluia, vai à praia, vai à festa dançante e outras distrações.

Para o católico que faz memória na semana santa a expressão é outra. Jesus Cristo é trazido em memória aos dias de hoje. Tanto identifica a paixão continuando hoje, nos que sofrem a desigualdade social, nos marginalizados, como percebe a ressurreição acontecendo nas pessoas e comunidades que conseguem já seguir o Projeto de Jesus, expresso nas bem aventuranças.

Para este tipo de cristão, o ponto mais central da semana santa é o domingo da ressurreição, quando se faz memória da vitória sobre a morte. São Paulo é quem ilustra bem essa experiência de memória quando diz em uma de suas cartas – “Se Cristo não ressuscitou é inútil nosso esforço e nossa fé…” Mas Cristo ressuscitou, venceu a morte e garantiu a todos seus seguidores a vitória sobre essa realidade misteriosa da morte física que abate tantas pessoas e leva outras ao fatalismo.

A vida continuará, porque Cristo garantiu e deu o exemplo com sua própria ressurreição. Daí o ponto central da semana santa, o domingo da ressurreição, celebrado com hinos e festas, sem ovos de páscoa e coelhinhos, símbolos do consumismo capitalista que tenta subverter o sentido sagrado do acontecimento da vida retomada por Cristo.

Os rituais de memória supõem um espalhar-se nos fatos passados, um olhar sobre Jesus e supõe também um passo de revisão de vida e conversão. Sem mudança de algum aspecto da vida, o cristão não celebrou a semana santa como memória da vitória de Cristo. Por isso, ele afirmou, entre outras coisas – “Não tenham medo, eu estarei com vocês todos os dias…”.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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