Um apelo à conservação das nossas praças

O livro do Gênesis descreve de forma poética , mas refletindo uma teologia de alcance social, a missão do homem em cultivar e administrar a sociedade terrena. Esse é o seu campo de missão. “Deus colocou o homem no Jardim do Éden para cultivá-lo e guardá-lo … e Deus viu que tudo era bom” (Gen. 2,15). Muitas religiões conheceram em comum o mito de uma idade de ouro, onde o homem vivia feliz num jardim maravilhoso. Para muitos, esse mito é uma maneira de descrever a felicidade futura da humanidade. No Islã, o paraíso (Al Janna) é um jardim magnífico que permite ao que crê conhecer os bons prazeres. A bíblia também utiliza essa palavra – paraíso – que vem do persa e que significa ” terra plantada de árvores”. Esse termo na bíblia – em hebreu é éden – quer significar o lugar de delícias onde se encontram o homem e a mulher no início da criação e onde a humanidade se reencontrará, cheio de felicidade, no fim de sua caminhada terrestre, conforme o livro do Apocalipse, cap. 2,7. Naturalmente, que os redatores desses textos não pensaram num paraíso terrestre como vemos nos out-doors anunciando belos hotéis, com todos os requisitos de conforto que se possa desfrutar. Há sempre no homem essa busca do “paraíso perdido”.

Todo esse início pretende fundamentar a necessidade das praças e jardins públicos, não apenas serem criados para a população, mas, sobretudo, que sejam conservados. Esses são lugares privilegiados de democracia – todos, pobres e ricos podem a eles ter acesso.
Há poucos dias houve uma grande reunião na Fundação João Fernandes da Cunha,onde é venerada a memória desse ilustre baiano falecido, como um grande devoto de Maria, no dia 8 de dezembro de 2006, para tratar dessa problemática. A Associação Baiana de Defesa das Praças , que tem o vereador Sylvonei Sales como presidente, convocou os moradores das cercanias do Campo Grande para debater o abandono daquela praça , considerada “a mais amada”, pois simboliza os ideais libertários que marcaram a Bahia, em muitos momentos de sua história, mas, sobretudo, com o 2 de Julho. É lá que essas figuras simbólicas , o Caboclo e a Cabocla, permanecem em vigília, cercadas pelo povo, naquela magna data.

A essa reuniam estavam presentes, alem do ilustre Vereador, o Prefeito João Henrique, seu vice, o representante de Parques e Jardins, alem de numerosos representantes das comunidades adjacentes. Todos constataram o abandono em que se encontra esse belíssimo parque, inaugurado há menos de 4 anos, dotando os baianos e visitantes de um ambiente aprazível, arborizado, bonito e limpo.
Nessa ocasião foram entregues e lidos dois gritos de apelo formulados por pessoas realmente interessadas na conservação dessa praça. A primeira foi da senhora Gildete Café, que com suas irmãs, faz anualmente um belo e grande bazar natalino no edifício Vitória Régia. Lá ela chama o Campo Grande de “cartão postal da Cidade”. ” A bem da verdade, diz ela, apreciávamos o paisagismo, as áreas bem plantadas, floridas, bem granadas, as fontes luminosas, os pequenos lagos, o parquinho, os espaços para as tão recomendadas caminhadas”. Mas ela mostra que a realidade hoje é outra. O parque começa a ser depredado : as imagens de mármore estão sendo descaracterizadas com detalhes que marcam a passagem de um certo vandalismo – há imagens com bigodes, óculos, etc. De outro lado, essa área já está oferecendo aos assaltantes e pivetes, ocasião e facilidade para as suas fugas , através dos acessos e escadarias. Mas podemos nos perguntar : onde está a Guarda Municipal, a vigilância, para que haja segurança aos transeuntes. Ela ainda lembra que é urgentíssimo que se faça uma desratização para combater o grande número de ratos que se “exercitam” naquela área – a higiene torna-se precária, os sanitários sujíssimos, levando as pessoas a fazerem suas necessidades nos jarros e plantas ali colocados.

Outra moradora, Nilda Fernandes dos Santos Silva leu um poema intitulado “O Campo Grande chora” : “Plantas são arrancadas… canteiros são pisados… o dinheiro do contribuinte desce pelo ralo… destruir é tão fácil… Pessoas ‘intoxicadas’ pela vida severina e pelas drogas … uns dormem… outros agridem …área infantil careca da grama artificial. Brinquedos quebrados . É um pedacinho da natureza retratada nos meandros desse jardim”. E por fim, o Campo Grande grita e se contorce :”Sou baiano,pulo carnaval, escuto promessas e bate-papos,sou situação em qualquer governo. Sou o presente de você, morador, de você visitante… Choro… cuidem de mim …”
No dia 14 de junho haverá outra reunião no mesmo local. E o senhor Prefeito se comprometeu a levar uma empresa que irá adotar o Campo Grande.
Afinal de contas, Maria Bethânia cantou no seu último e belo show “que o paraíso é aqui na Bahia”.

Prof. de Antropologia da Uneb, Cairu, Faculdade 2 de Julho. Membro da Academia Mater Salvatoris e do IGHB. Colabora nas Paróquias da Vitória e de S. Pedro.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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