Sim, a nossa Capital federal não parece estar no Brasil. É a impressão que fica ao visitante que passa alguns dias por lá, como tive oportunidade de fazê-lo no início deste fevereiro.
Cidade única no mundo, Brasília não tem as prosaicas ruas e praças, de que toda cidade dispõe. É toda feita de Super-Quadras, com grandes blocos de majestosos edifícios, em grande parte apartamentos funcionais. À beira do lago Paranoá, estão as mansões distribuídas em Lago Norte e Lago Sul, com alguns arremedos de ruas. Fala-se na Praça dos Três Poderes. Na verdade, um imenso e magnífico espaço, onde se colocam, como se fossem ali cuidadosa e artisticamente depositados, os prédios-símbolos dos três Poderes da República: de um lado o do Poder Executivo, o Palácio do Planalto, com sua bem ostensiva rampa, que é galgada pelo depositário supremo da confiança da Nação, do outro o do Poder Judiciário, o Palácio da Justiça, tendo à frente sua artística estátua sentada de olhos vedados, e no centro, o do Poder Legislativo, as duas Casas do Congresso Nacional, num único e maravilhoso conjunto, como a significar que este Poder deve ser o principal e a matriz dos demais. E será que é? – os fatos dos dois anos passados estão a desmentir essa verdade. Para chegar aí, aos três símbolos dos Poderes, atravessa-se uma, que não é avenida, mas imensa esplanada sem similar em nosso país, que é a Esplanada dos Ministérios, onde têm sede os vários órgãos, cada vez mais multiplicados e cada vez menos eficientes, da ação governamental. Tudo muito alheio ao Brasil de verdade, o Brasil das favelas, das ruas imundas e das praças mal cuidadas.

As grandes cidades brasileiras, mesmo as mais ricas, como Rio e São Paulo, têm o centro invadido pelos camelôs, o comércio dos pobres, e repleto das pessoas que vêm dos subúrbios para adquirir utilidades a preço baixo ou algum humilde importado, via Paraguai. Vejo isso no Recife, na Praça do Carmo e adjacências, ponto de encontro da pobreza recifense, vinda dos remotos subúrbios, dos morros e das cidades-dormitórios, que fazem o Grande Recife.

Em Brasília, não! Com exceção da Rodoviária, o que se vê são apenas funcionários públicos devidamente engravatados. Os pobres de Brasília, os descendentes dos candangos, que construíram a Capital dos sonhos de JK, estes foram habilmente afastados do chamado Plano Piloto e se encontram nas várias cidades-satélites, hoje já inchadas e super-povoadas pela pobreza brasiliense. São esses, que quase só podemos encontrar na Estação Rodoviária, exatamente no início e no fim de dura jornada, como diaristas dos apartamentos das madames, vigilantes de casas particulares, comerciários e outros humildes trabalhadores.
Brasília é realmente dos mais belos cartões-postais do Brasil. Mas não é o Brasil que conhecemos…

(*) É arcebispo emérito de Maceió

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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