Estive em Cachoeira a convite da Irmandade da Conceição do Monte para participar do novenário daquela festa. Em cada dia é convidado um pregador com um tema específico. O que coube a mim foi :”Fazei tudo o que Ele vos disser” (Jo. 2,1-11), que é o texto relacionado com as Bodas de Caná – lá, Maria pede a Cristo que faça o milagre da conversão do vinho em água para livrar os donos da festa do dissabor de não terem mais vinho para servir. E a verdade desse fato bíblico, é que o Senhor Jesus antecipou a sua “hora” para atender à sua Mãe.

Nesses dias que antecedem a festa da Imaculada Conceição, os novenários estão presentes em muitas paróquias baianas. Tudo isso fruto da devoção bem presente à fé católica de que Maria, junto do único Mediador, é uma intercessora bem constante aos muitos filhos que recebeu por mandato do Cristo : “Mãe, eis os teus filhos”. Aqui em Salvador a Conceição da Praia polariza o calendário não apenas da Cidade Baixa, mas para lá acorrem fiéis e turistas de todos os recantos. Sem ter feito uma pesquisa mais acurada, já me lembro de duas cidades que têm essa devoção no seu nome : Conceição de Feira e Conceição do Coité.

Na teologia bíblica, Maria é aquela que não retém as honras, mas sempre aponta para o seu Filho e Salvador. Há na vida dela uma centralidade de Cristo que se faz presente do “sim” ao Anjo Gabriel e segue até à última “espada de dor” no Calvário. A própria teologia tem o cuidado criterioso de distinguir os muitos cultos que permeiam a devoção cristã- católica: para o Senhor Deus, Uno e Trino, o culto é o de latria, para os santos é o de dulia, mas para Maria, sempre vista como a “cheia de graça” e “a bendita entre as mulheres”, reserva-se o culto de hiperdulia.
São tantos e tantos os títulos que acompanham a devoção a Maria : Fátima, Lurdes, Loreto, Salete, Nazaré, Guadalupe, Penha, Aparecida, Ajuda, Rosário, Carmo, Boa Morte, Dormição, Conceição – só em Cachoeira esse título se desdobra em dois: Conceição do Monte (decorrente da Irmandade que já existe desde 1780) e Conceição dos Pobres, no Caquende, que é posterior. Essa última é uma expressão da comunidade menos favorecida, pois a primeira refletia o apogeu da cidade, sendo integrada, outrora, pela elite econômica da cidade. De qualquer forma, Maria é mãe de todos, pobres e ricos, brancos e pretos – todos têm um lugar no seu regaço materno – nós é que fazemos as diferenciações, classes e estamentos sociais.

Essa festa da Conceição já era celebrada na Inglaterra e Normandia no século XI. Stº Anselmo de Cantuária (1033-1109), filósofo, teólogo e um dos fundadores da escolática, realçou a verdadeira grandeza do mistério que se realiza na concepção de Maria que é o fato dela ter nascido preservada de toda mácula. Em 1439 o Concílio de Basiléia considerou este mistério como uma verdade de fé, e o Papa Pio IX proclamou-o como dogma em 1854.

Maria é reconhecida como a nova Eva, Mãe de todos os viventes. Assim, aparece Maria ao lado de Cristo, o novo Adão, e por isso se nos apresenta como figura da mulher ao lado do homem . Maria é aquela que ajuda a descobrir o lugar e o papel da mulher na salvação da humanidade; ela simboliza a reivindicação da dignidade da mulher contra tudo o que atenta contra ela.
Concluo com algumas estrofes cantadas na novena celebrada em Cachoeira:
“Bendita e louvada seja / Senhora da Conceição / É bastante o nome dela / Pra nos dar consolação. / Dia e noite, noite e dia / Eu trago no coração / A Virgem sempre venerada / Senhora da Conceição.”


Professor de Antropologia da Uneb, da Cairu, da Faculdade 2 de Julho. Membro da Academia Mater Salvatoris. Colabora nas Paróquias da Vitória de S. Pedro. 

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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