Em tempos eleitoreiros, muita gente, mais puritana que pura, tripudia contra sanguessugas e mensaleiros. Não se pode, é claro, quem, na onda denuncista, agita a bandeira da moralidade contra o assalto ao patrimônio que deveria ser público. Se não fosse uma peça de marketing momentâneo para iludir o eleitorado e, que acaba em pizza, deveríamos apoiá-la uma vez que “a verdade independe do canalha que a pronuncia”.
A ocasião se presta para um questionamento da concepção de uma ética que não se baseia na justeza nascida de uma ética universal do ser humano. É apenas adequação a uma justiça proclamada pelo atual modelo de organização política. Não nasceu da fidelidade a princípios morais, mas da imposição de quem tem mais força e da defesa de seus interesses, neste momento. Ainda que seja legal, pode ser profundamente imoral.
Construiu-se no senso comum que política é a arte do possível para divulgar certo determinismo e fatalismo. Ao se dizer que política é arte de tornar possível se foge da impotência, mesmo reconhecendo que política é disputa.
Marilena Chauí, num debate recente sobre o momento conjuntural, diz que qualquer pessoa, a vigorar a atual justiça e organização política, ainda que santa, não escaparia de uma possível corrupção. É inerente ao próprio sistema. Sem mudar os parâmetros da justiça e da política, vai ser inútil buscar a ética na política.
Segundo ela, na organização dos bens materiais, na economia, deveria valer o que vale no interior das famílias. Aí, funciona a justiça distributiva – por mais que ganhe um filho mais velho, ele não questiona que o irmão tenha todo o necessário, ainda que não produza. Já na política, independente do poder econômico e das diplomações, funcionaria a justiça participativa. Quer dizer, toda pessoa teria o mesmo peso na hora da decisão. Com esses horizontes se tem outra idéia de justiça e de política e se pode cobrar mais ética.
agosto de 2006