A POLÊMICA DO CÓDIGO DA VINCI
Falem mal, mas falem de mim. Poucas máximas do marketing se aplicariam tão bem a O Código da Vinci. Proibido moralmente pela Igreja Católica e criticado ferozmente por religiosos praticantes, somente o anúncio sobre o início das filmagens criou uma expectativa vista poucas vezes na história do cinema. Não é por menos. Os números oficiais do livro impressionam: desde o lançamento em 2003, o Código da Vinci vendeu mundialmente 40 milhões de cópias e já foi traduzido para 44 idiomas. No final do ano passado, Dan Brown foi nomeado na Time uma das 100 pessoas mais influentes do mundo, na famosa e histórica lista anual publicada pela revista americana.
As estatísticas também transformam Dan Brown em um paradoxo da literatura deste início de século, algo parecido com o que Paulo Coelho foi nos anos 90 com milhões de cópias vendidas e críticas recebidas. Em outras palavras, um autor duramente criticado por muitos que se dizem “especialistas” e por setores diversos da Igreja mas, ao mesmo tempo, vorazmente lido por todos eles.
Além de todas as polêmicas – que sempre levam mais e mais pessoas ao cinema – a adaptação para a tela grande conta com um elenco estelar de causar inveja: Tom Hanks, Audrey Tautou (a eterna Amélie Poulain), Jean Reno, Alfred Molina, Ian McKellen e Paul Bettany, entre outros. A direção é de Ron Howard, o mesmo de “Cinderella Man” (2005), “Uma Mente Brilhante” (A Beautiful Mind, 2001) e “Apollo 13” (1995).
Engraçado, talvez até de forma proposital, é o pôster oficial do filme: naquela exata posição em que se encontram Tom Hanks (à frente, esquerda) e Audrey Tautou, com aquele mesmo jogo de luz e feições, o bom cinéfilo achará impossível não recordar de vários pôsteres de Arquivo-X com David Duchovny e Gillian Anderson, que durante nove anos encarnaram os papéis de Fox Mulder e Dana Scully. Para piorar, a tagline oficial é ¿Seek the Truth¿ ¿ algo como “procure a verdade”. Qualquer semelhança com “the truth is out there / a verdade está lá fora” é mera coincidência.
OPUS DEI e RELIGIÃO –
Verdade seja dita: até o lançamento de O Código Da Vinci, pouquíssimas pessoas sequer haviam ouvido falar em Opus Dei, o braço ultra-conservador da Igreja Católica. Somente aqueles interessados em história e religião deveriam ter conhecimento factual da existência desse grupo que não apenas existe e é bastante cultuado, mas também exerce uma curiosa influência sobre políticos e setores da mídia. É deveras interessante notar que, com o destaque mundial à Opus Dei após o Código Da Vinci, os brasileiros tenham tido a oportunidade de saber que, aqui no Brasil, há gente influente que admira ou segue a cartilha do grupo.
A Opus Dei foi fundada na Espanha em 1928 e, mesmo dentro do universo de católicos praticantes, muitas vezes é duramente criticada por conta dos segredos, elitismo e intolerância, além das conivências em atos de autoflagelação física dos integrantes – assunto que é abordado de forma bem visual pelo filme. A direção da Opus Dei enfatiza a espiritualidade e o compromisso com o trabalho e o dever, um estigma bem conhecido dos brasileiros (que são da época) da famigerada Tradição, Família e Liberdade – TFP.
Seus integrantes se orgulham de que o fundador da Opus Dei, Josemaría Escrivá de Balaguer, tenha sido canonizado pelo papa João Paulo II em outubro de 2002. Com um histórico de conivências desse porte, não é à toa que o grupo já programou uma série de protestos e movimentos para boicotar a exibição do filme durante a estréia, nos Estados Unidos.
Enquanto isso, aqui no Brasil, um mês antes do lançamento do filme o presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Geraldo Majella Agnelo, antecipou-se e aconselhou os católicos a não assistirem ao O Código Da Vinci. Em entrevista à imprensa, o cardeal argumentou que se trata de “uma imagem distorcida de Jesus Cristo, que está em contraste com as pesquisas e afirmações de estudiosos de diversas áreas das ciências humanas, da teologia e dos estudos bíblicos”.
De lá para cá, as manifestações da Igreja só aumentaram. Na Índia, um grupo até colocou Dan Brown em uma espécie de lista negra para morrer.
Sugestões de leitura:
– Opus Dei, a falsa obra de Deus. De Elisabeth Castejon Lattaro Silberstein, 340 pp. Editora DPL, São Paulo, 2005.
– Opus Dei – Os Bastidores. De Dario Fortes, Jean Lauand e Marcio Fernandes
Na Internet – www.opuslivre.org e www.opusdei.org.br
(17.05.2006)