Está começando mais um ano letivo em nosso país. Mais um ano de esperanças e anseios. Mais uma temporada de expectativa do verdadeiro crescimento e progresso da nação, que só se realiza pela educação, como a história contemporânea está demonstrando nos chamados países emergentes. No Rio de Janeiro, de 21 a 24 de janeiro últimos, e em São Paulo, de 28 de janeiro a 3 de fevereiro, marcaram encontro as mais famosas grifes da moda internacional. Protagonistas desses dois eventos, o início das aulas escolares e os desfiles de moda são: a Professora e a Modelo.
Examinemos a missão das duas. A professora tem por missão educar, isto é, formar as novas gerações, construir o futuro da nação, mediante o acesso dos cidadãos à cultura, ao conhecimento, à ciência, desenvolvendo suas aptidões e contribuindo para o exercício da plena cidadania. É trabalho árduo, que exige séria preparação e muita canseira. Anos de estudo e de dedicado empenho. Não pretendo aqui negar o valor da profissão da modelo, respeitável e importante agente para a indústria, para o comércio e para o desenvolvimento social, sobretudo das elites. Sua profissão, honesta e exigente, também cheia de sacrifício, é mostrar novas roupas, promover vendas, divulgar arte. Em resumo: a professora forma pessoas, a modelo vende roupas.
E como são pagas ambas? Aqui vem a grande e escandalosa diferença. A revista INTERPRENSA IP, em seu número de novembro 2003, fornece dados de uma pesquisa nacional por amostra de domicílio (PNAD) de 2001 sobre os salários dos professores. No ensino médio, um professor percebe um salário mensal de R$ 866,23. Seus colegas do ensino fundamental recebem R$ 599 (da 5ª à 8ª série). Já da 1ª à 4ª série, os salários eram em 2001 de R$ 461, de acordo com o PNAD.
Em janeiro do ano passado, a imprensa divulgou por todos os canais da mídia nacional que uma top model doara para o programa do Governo Fome Zero metade (vejam bem, metade!) do que recebera num único desfile na São Paulo Fashion Week, no valor de R$ 50.000…
E agora, a reflexão que somos forçados a fazer, juntamente com a citada revista. Para que uma professora da 1ª à 4ª série possa receber cem mil reais, o que a top model recebeu num único desfile, ela precisaria trabalhar 18 anos e uma professora do ensino médio deveria ensinar 9,6 anos para reunir esta quantia, que uma modelo de fama internacional recebeu de um único trabalho. Ou seja, continua a aludida revista, três ou quatro desfiles de uma modelo equivalem ao salário de trinta anos de esforço e dedicação – toda um vida profissional – de uma professora do ensino médio ou fundamental. Cito ainda a revista IP: “A educação é fundamental para o país, afirmam os políticos. O desenvolvimento econômico e o futuro do Brasil dependem da educação, propalam os economistas. A sociedade pede educação, mas no fundo não a valoriza devidamente.”.
Sei muito bem – e nem pretendo negá-lo aqui – que a profissão de modelo também exige esforço e sacrifício da saúde, dos estudos, muitas vezes interrompidos, do ambiente familiar. Há ainda os degraus, que ela com esforço e perseverança deverá galgar, de iniciante, profissional, de fama nacional e finalmente, top model, de fama internacional. Sei também que a profissão é efêmera e passageira, como o atletismo.
A sociedade paga a ambas pelos impostos arrecadados. E aí fica a conclusão: a sociedade valoriza tanto o vestido que envolve o corpo e tão pouco a formação moral e intelectual de nosso povo.